MOISÉS MENDES

O pacto com a morte

Por Moisés Mendes / Publicado em 27 de março de 2020
"Todos foram eleitos como detentores de uma virtude. Seriam caçadores de bandidos. Nunca ninguém viu nenhum deles caçar um bandido"

Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

“Todos foram eleitos como detentores de uma virtude. Seriam caçadores de bandidos. Nunca ninguém viu nenhum deles caçar um bandido”

Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

São muitos os que acreditam que o coronavírus fará pela democracia brasileira o que a política convencional nunca conseguiria fazer. A pandemia poderá finalmente derrotar uma família inteira de farsantes.

O vírus que não infecta o corpo de Bolsonaro, apesar de intrometer-se na vida dos que estão ao seu redor, poderia destruí-lo politicamente.

Mesmo que não seja fácil. A farsa dos Bolsonaros se sustenta nesse que é o bem mais poderoso da representação numa democracia, o voto. Somados, o pai e os três filhos têm tudo isso de votos: 64.128.657.

Se todos os habitantes da Itália, incluindo as crianças, viessem votar aqui nos mais poderosos brasileiros do século 21, e que descendem de italianos, faltariam 4 milhões de votantes.

Jair, Flavio, Carlos e Eduardo têm juntos um poder que nenhuma outra família tem nas democracias. Grupos familiares de déspotas são impostos ao povo a ferro e fogo. E os Bolsonaros foram eleitos.

Não há nada aparecido com a ascensão política de uma família em países democráticos, em toda a História da humanidade, em que um pai tem tantos filhos ao mesmo tempo ao seu redor no poder. Nem os Bush. Nem os Kennedy.

Os filhos de Bolsonaro estão ou passaram por todos os níveis de funções legislativas. Carlos, o Carluxo, é vereador eleito em 2016 com 106.657 votos (o mais votado do Rio). Em 2018, Eduardo elegeu-se deputado federal por São Paulo com 1.843.735 votos (o mais votado da História no Brasil). Flávio, depois de ser o deputado estadual das rachadinhas na Alerj, ainda foi escolhido senador por 4.380.418 eleitores. E Jair elegeu-se presidente com 57.797.847 de votos.

Todos são farsantes, mas todos têm o que os 3 mil militares que estão no poder, como servidores escolhidos por Bolsonaro, não têm. Por isso os Bolsonaros são a melhor contribuição brasileira para as reflexões e a apresentação de fatos sobre a morte das democracias.

Todos foram eleitos como detentores de uma virtude. Seriam caçadores de bandidos. Nunca ninguém viu nenhum deles caçar um bandido.

Quase todos andam armados ou adoram armas, mas não se conhece uma iniciativa, uma só, de qualquer um deles que expresse alguma preocupação real com a caçada a bandidos, mesmo que nos moldes do faroeste.

Também dizem que os Bolsonaros são caçadores de corruptos. Não há nada nenhum registro que comprove essa qualidade dos Bolsonaros. Mas há provas de que bandidos e corruptos são aliados dos Bolsonaros.

Há processos que avançam e recuam na Justiça do Rio sobre a ação de milicianos que conviveram com os Bolsonaros e trabalharam para a família.

Mas a mais farsante das famílias de todo mundo não enganou 64 milhões de pessoas. A maior parte dos que votaram nos Bolsonaros sabe o que eles são. A escolha não foi feita pelas falsas virtudes de um marketing mentiroso, mas por defeitos que valeriam como qualidades.

Os Bolsonaros são racistas, homófobos, xenófobos, mas o que importa é que prometeram agir como caçadores de esquerdistas e por isso ganharam o voto da maioria. São fascistas amadores que se profissionalizaram.

Os Bolsonaros são o triunfo da aberração familiar como projeto político que deu certo e agora chegam ao topo da amoralidade e da falta de escrúpulos como aliados de uma peste.

São o único grupo político do Planeta que não só subestima, sem dúvidas e sem recuos, o poder destruidor da pandemia, como estimula sua propagação.

A disseminação da doença talvez seja a única força capaz de confrontar os Bolsonaros com a realidade criada com seus milhões de seguidores nas redes sociais, que acreditam nas suas mentiras e compartilham seus ódios.

O coronavírus pode derrotá-los politicamente com a armadilha que os empurrou para o pacto insano com a peste e com a morte.

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