POLÍTICA

Convocação de Milton Ribeiro para explicar escândalo no MEC será votada no Senado

Alvo de notícia-crime ao STF, ministro da Educação pode ser convocado pela Comissão de Educação para explicar esquema de distribuição de verbas a pastores
Por Gilson Camargo / Publicado em 23 de março de 2022

Foto: Reprodução

Refém de pastores: ministro Milton Ribeiro, com os pastores Arilton Moura (ao fundo) e Gilmar Santos

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A Comissão de Educação (CE) do Senado votará na quinta-feira, 24, um requerimento do líder da oposição, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pedindo a convocação do ministro da Educação, Milton Ribeiro. Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) apresentou notícia crime ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo investigação do escândalo. O deputado federal Ricardo Silva (PSB-SP) também cobra explicações. O parlamentar protocolou um requerimento de convocação de Ribeiro para prestar esclarecimentos à Câmara dos Deputados sobre o áudio vazado. Na terça-feira, 22, o deputado estadual Carlos Gianazzi (PSol-SP) e o senador Alessandro Vieira (PSDB-SP) protocolaram separadamente representações para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue Milton Ribeiro. Ao mesmo tempo, Ribeiro pode deixar o ministério em meio ao escândalo.

“Resta claro que o ministro da Educação, ao conceder liberação célere de recursos, priorizando atender ‘a todos que são amigos do Pastor Gilmar’, patrocina ou apadrinha diretamente interesse privado perante a administração pública, valendo-se para isso da sua qualidade de funcionário público, o que configura crime de advocacia administrativa”, afirma Contarato.

O ministro é acusado de comandar um esquema irregular de distribuição de verbas da pasta a pedido do presidente da República, Jair Bolsonaro. A existência de um gabinete paralelo composto por pastores evangélicos que não participam do governo, mas controlam a agenda e a execução orçamentária do MEC foi revelada em reportagens dos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo.

Em áudio obtido pelos jornais, o ministro Milton Ribeiro afirma que uma de suas prioridades é “atender aos amigos” de um dos pastores, e explica que isso foi um pedido do presidente Bolsonaro. O esquema destinaria verbas para obras e compras de equipamentos escolares em cidades indicadas pelos pastores.

“Os fatos narrados são gravíssimos e cabe a este parlamento a apuração com rigor dos eventos, o que só será possível com o comparecimento pessoal do ministro para prestar os devidos esclarecimentos”, justifica Randolfe no requerimento à Comissão de Educação.

Se o pedido for aprovado, como se trata de uma convocação, o ministro Milton Ribeiro terá a obrigação de comparecer perante à comissão. Do contrário, poderá ser denunciado por crime de responsabilidade.

A deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) compartilhou em suas redes sociais a reportagem da Folha que pode derrubar Ribeiro.

“O MEC mais incompetente da história é também antro de corrupção, improbidade administrativa e tráfico de influências. São escandalosos os áudios em que o próprio ministro mostra que o objetivo dele nunca foi a educação. Vamos cobrar providências do PGR. Mais um ministro vai cair!”, afirmou a parlamentar.

Verbas e agenda do MEC nas mãos de pastores

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Durante encontro com evangélicos no Palácio do Planalto, no dia 8, Bolsonaro afirmou que leva o país “para o lado que os senhores assim desejarem”

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O escândalo do MEC foi revelado em duas reportagens. No sábado, 19, o Estadão publicou reportagem assinada pelos jornalistas Breno Pires, Felipe Frazão e Julia Affonso, revelando que o ministro da Educação, Milton Ribeiro, tem um gabinete paralelo composto por pastores evangélicos de fora do governo que controlam a verba e a agenda do MEC.

Na segunda-feira, 21, a Folha revelou uma conversa gravada do ministro, afirmando que sua pasta prioriza as demandas dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura que desde janeiro de 2021 intermediam repasses de recursos federais para prefeituras em obras de creches e escolas, quadras de esportes e aquisição de equipamentos.

“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do Gilmar”, afirma Ribeiro no áudio revelado na matéria assinada por Paulo Saldaña.

Em encontro com pastores evangélicos no início de março, Bolsonaro deixou clara a terceirização do seu governo para as igrejas ao afirmar que conduz o país “para o lado que os senhores assim desejarem”.

Os pastores citados pelo ministro na gravação são aliados de Bolsonaro, atuaram na campanha eleitoral e transitam livremente nos gabinetes da Esplanada dos Ministérios.

Gilmar Silva dos Santos, 61 anos, é natural de São Luís (MA) e comanda o Ministério Cristo Para Todos, denominação de uma das diversas correntes da Assembleia de Deus em Goiânia (GO).

Arilton Moura Correia vive no Pará e preside o Conselho Político da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil Cristo para todos e esteve nomeado em cargo de confiança do PMDB na Câmara dos Deputados em 2020. 

Evangélico e homofóbico

Nascido em Santos (SP), pastor da Igreja Presbiteriana, Milton Ribeiro tem 63 anos, é teólogo e advogado, com doutorado em Educação. Ele assumiu o MEC em julho de 2020 por indicação do também pastor André Mendonça que ocupava a Advocacia Geral da União (AGU), foi ministro da Justiça de Bolsonaro e virou ministro do STF.

Em maio de 2019, Ribeiro foi nomeado por Bolsonaro para a comissão de ética pública ligada à Presidência da República, com a função de investigar ministros e servidores do governo.

Ribeiro foi denunciado em setembro de 2020 pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelo crime de homofobia após afirmar em entrevista ao Estadão declarando que adolescentes “muitas vezes optam pelo caminho do (sic) homossexualismo” e atribuiu a orientação sexual à influência de “famílias desajustadas”.

As declarações do ministro motivaram uma ação civil pública de entidades de defesa dos direitos da população LGBTQI+ que pediram uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 5 milhões. O caso foi julgado pela Justiça Federal de São Paulo, que condenou a União ao pagamento de R$ 200 mil.

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