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À espera de um transplante, morre Rochelle Benites

Há três anos na lista de espera por um transplante pulmonar duplo, em decorrência de uma doença autoimune, Rochelle se tornou uma ativista da doação de órgãos. Ela deixa três filhos
Por Valéria Ochôa / Publicado em 19 de agosto de 2021
Rochelle Benites

Foto: Igor Sperotto

Rochelle deu visibilidade a realidade de milhares de pessoas que aguardam por transplante no Brasil

Foto: Igor Sperotto

Morreu no início da tarde desta quinta-feira, 19, Rochelle Fraga Benites, 42 anos, uma das 2.172 pessoas na lista de espera por transplante no Rio Grande do Sul e uma das 45.664 do país. Tinha Histiocitose X, uma doença autoimune que atacou seus dois pulmões e a levou à lista de transplante duplo há três anos. Rochelle deixa três filhos,  Júlia, 11 anos, Murilo, 15, e Mateus, 17.

Entusiasta dos esportes, jogava futebol e andava de skate, Rochelle Benites passou a depender 24 horas de um cilindro de oxigênio a espera do transplante.

Ao descobrir na pele as dificuldades enfrentadas pelos pré-transplantados, da negativa familiar para a doação à falhas no processo médico-hospitalar, assumiu a militância da causa, dando visibilidade à realidade de milhares de pessoas na lista de espera no Brasil. Fez um curso de extensão na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) para aprender mais sobre o tema, criou o projeto Vida em Jogo, que levou para estádios de futebol pacientes e médicos para sensibilizar as torcidas para A doação de órgãos, se engajou com a Frente Parlamentar de Doação de Órgãos e passou a fazer lives regulares nas redes sociais com a participação de autoridades no assunto.

Foto: Igor Sperotto

Conversando sobre doação de órgãos e transplantes com professores e funcionários do Colégio Rosário, de Porto Alegre

Foto: Igor Sperotto

“Conheci a Rochelle no ano passado quando ela me convidou para fazer uma live sobre transplante de pulmão. Uma mulher muito determinada. Ela criou um grupo, buscou instigar e motivar o transplante mesmo num ano e em um momento super difícil para todos que foi o da pandemia. Eu a conheci e passei admirar e festejar esse lado dela. Com a perda da Rochelle perdemos uma paciente e uma amiga, que tentou melhorar o processo do transplante e nos transformar em pessoas melhores. Que nos sirva de motivação para avançarmos”, declara o médico Spencer Camargo, cirurgião torácico do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.

Rochelle foi uma guerreira do coletivo. Lutou pelo atendimento prioritário aos pré-transplantados nos hospitais, emergências, nos bancos, para que não faltasse medicação na farmácia do estado e, fundamentalmente, para um melhor planejamento e organização da Central de Transplantes do Rio Grande do Sul na captação de órgãos e no treinamento de médicos e enfermeiros, considerado por especialistas da área como um dos maiores problemas do processo da doação ao transplante.

Em entrevista ao Extra Classe no ano passado sobre a suspensão dos transplantes no Rio Grande do Sul em função da pandemia revelou sua apreensão: “Tem muito despreparo em alguns hospitais para lidar com as pessoas que precisam de oxigênio. A gente não tem prioridade no atendimento. A sociedade não está pronta para acolher o paciente em risco. E 1% da população é transplantada”.

“Uma mulher corajosa, uma guerreira, braba, destemida, frágil, amava a vida, a Júlia, o Murilo, o Mateus e o mar”, expõe Glaci Borges, coordenadora do Cultura Doadora da Fundação Ecarta, projeto do qual Rochelle era parceira. “Por ela, estaria aqui com a gente, dando depoimentos, fazendo lives, forte, potente, bonita. Mas não deu. Ela descansou. Estava exausta. Vai fazer muita falta. A causa perde uma militante e eu uma amiga”.

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