JUSTIÇA

Assassinato de liderança mobiliza indígenas no Maranhão

Crime aumentou clima de tensão e preconceito contra comunidades na região, alvo de declarações contra a demarcação e regularização de terras
Por Gilson Camargo / Publicado em 4 de novembro de 2019
Paulo Paulino Guajajara, 26 anos, foi morto por madeireiros em uma emboscada na Terra Indígena Araribóia

Foto: Reprodução

Paulo Paulino Guajajara, 26 anos, foi morto por madeireiros em uma emboscada na Terra Indígena Araribóia

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Lideranças indígenas denunciaram nesta segunda-feira, 4, na Câmara Municipal de Imperatriz, a 629 quilômetros de São Luís, a omissão das autoridades federais em relação à ação de madeireiros que estão invadindo as terras indígenas na região. Representantes dos povos indígenas ocuparam o plenário da Câmara e protestaram contra a falta de segurança que favorece as ações armadas contra as comunidades. A tensão aumentou nas áreas demarcadas depois que o líder indígena Paulo Paulino Guajajara, 26 anos, foi morto, no sábado 1º de novembro, em uma emboscada na Terra Indígena Araribóia, na região de Bom Jesus das Selvas, entre as aldeias Lagoa Comprida e Jenipapo, no Maranhão. A violência e a crise de direitos humanos enfrentada pelos povos indígenas do país sob o governo Bolsonaro vêm sendo denunciada na Europa por oito lideranças, com a campanha Sangue Indígena: Nenhuma Gota a Mais, que tenta chamar a atenção de autoridades e líderes empresariais contra a crescente violência e devastação ambiental na Amazônia e no Brasil.

As lideranças do Maranhão alertaram durante a manifestação em Imperatriz que a execução do líder dos Guardiões da Floresta aumentou o clima de tensão e medo nas comunidades, onde as emboscadas são recorrentes nas últimas décadas. Com 413 mil hectares, a Terra Indígena Araribóia foi homologada e registrada em 1990. O território abriga 6 mil indígenas Guajajara, ou Tenetehar, e Awá-Guajá livres. Por conta de sua atuação na defesa dos povos indígenas e seus territórios, Paulino Guajajara vinha sofrendo ameaças de madeireiros, denunciou outra liderança, Fabiana Guajajara.

Segundo ela, as ameaças foram documentadas e embasaram pedidos de proteção e ações para combater os crimes na região enviados à Fundação Nacional do Índio (Funai), Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal (PF) e a Secretaria de Segurança Pública do Maranhão (SSP-MA). Láercio Souza Silva, que foi ferido no braço e nas costas por disparos de arma de fogo e conseguiu escapar da emboscada, explicou a agentes da Funai que ao menos cinco madeireiros participaram do crime. O madeireiro Márcio Greyuke Moreira Pereira também foi morto no atentado.

Lideranças da região alertaram na Câmara de Imperatriz o risco de novos atentados

Foto: Reprodução

Lideranças da região alertaram na Câmara de Imperatriz o risco de novos atentados

Foto: Reprodução

Em nota, a Polícia Federal informou que uma equipe está investigando o crime na Terra Indígena Araribóia em conjunto com a polícia civil do Maranhão. Apesar da competência para a apuração de crimes contra povos indígenas ser do governo federal, o governo do estado informou que enviou equipes de segurança e de defesa dos direitos humanos para a região.

“O que ocorreu a gente já temia, a gente já mandou vários documentos tanto para Funai, Ministério Público Federal, Polícia Federal e a própria Secretaria de Segurança Pública do Estado. Foi um crime, mas nós sabíamos das ameaças que eles vinham sofrendo. Já que ocorreu mais um crime e não foi o primeiro crime. Paulo Paulino foi mais um indígena assassinado. Hoje o clima é de tensão, de medo nas aldeias e o que a gente clama é por justiça.”, afirmou Fabiana.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) informou que a região da aldeia Lagoa Comprida, há muitos anos vem sendo invadida por madeireiros e lembrou a execução de outras lideranças, como Tomé Guajajara, assassinado em 2007. Na Terra Indígena Araribóia, homologada e registrada em 1990 com 413 mil hectares, vivem cerca de 6 mil indígenas Guajajara, ou Tenetehar, e Awá-Guajá livres, ou seja, em situação de isolamento voluntário. Essa realidade, segundo a entidade, vem sendo denunciada por oito líderes indígenas da Apib que estão em uma “intensa jornada pela Europa para denunciar a grave crise de direitos humanos que os povos indígenas do Brasil enfrentam sob o presidente Jair Bolsonaro”. A campanha Sangue Indígena: Nenhuma Gota a Mais pede às autoridades e aos líderes empresariais da Europa que respondam à crescente violência e devastação ambiental na Amazônia e em todo o país.

“Quem tem incentivado e permitido invasões a terras indígenas associadas a atentados, assassinatos, ameaças, esbulhos, incêndios criminosos é o próprio presidente, como ele mesmo admitiu no caso das queimadas”

Por conta de sua atuação na defesa dos povos indígenas e seus territórios, Paulino Guajajara vinha sofrendo ameaças de madeireiros

Foto: Patrick Raynaud/ Mídia Índia

Por conta de sua atuação na defesa dos povos indígenas e seus territórios, Paulino Guajajara vinha sofrendo ameaças de madeireiros

Foto: Patrick Raynaud/ Mídia Índia

“O Cimi vem denunciando o aumento das invasões dos territórios indígenas, fruto do incentivo dos agentes públicos e privados que se somam contra a regularização dos territórios concebidos pela Constituição Federal. Hoje não é exagero dizer que os indígenas não podem mais circular em seus territórios com segurança”, acrescenta o comunicado, que responsabiliza o presidente Jair Bolsonaro por declarações contra a demarcação e regularização dos territórios, seguidas de um ambiente regional preconceituoso contra os indígenas: “não nos cabe apenas exigir a apuração do fato em si, mas de denunciar quem tem incentivado e permitido invasões a Terras Indígenas associadas a atentados, assassinatos, ameaças, esbulhos, incêndios criminosos. E quem tem incentivado é o próprio presidente, como ele mesmo admitiu no caso das queimadas”.

Entre janeiro e setembro deste ano, de acordo com o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, do Cimi, contabilizou 160 casos de invasão a 153 terras indígenas de 19 estados, o que representa o dobro do que foi registrado em 2018.

“O governo Bolsonaro tem sangue indígena em suas mãos, o aumento da violência nos territórios indígenas é reflexo direto de seu discurso de ódio e medidas contra os povos indígenas”

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) também responsabilizou o governo federal pela violência na região. “O governo Bolsonaro tem sangue indígena em suas mãos, o aumento da violência nos territórios indígenas é reflexo direto de seu discurso de ódio e medidas contra os povos indígenas do Brasil. Nossas terras estão sendo invadidas, nossas lideranças assassinadas, atacadas e criminalizadas e o Estado Brasileiro está deixando os povos abandonados a todo tipo de sorte com o desmonte em curso das políticas ambientais e indigenistas”, diz em comunicado.

Essa realidade, segundo a entidade, vem sendo denunciada por oito líderes indígenas da Apib que estão em uma “intensa jornada pela Europa para denunciar a grave crise de direitos humanos que os povos indígenas do Brasil enfrentam sob o presidente Jair Bolsonaro”. A campanha Sangue Indígena: Nenhuma Gota a Mais pede às autoridades e aos líderes empresariais da Europa que respondam à crescente violência e devastação ambiental na Amazônia e em todo o país.

Sonia Guajajara, coordenadora executiva da Apib e liderança do Povo Guajajara, declarou que o Território Indígena Araribóia está em luto e que já faz tempo que eles vêm denunciando a situação de ausência do poder público na proteção dos territórios indígenas, assim como a invasão do território Araribóia para a exploração ilegal de madeira e a luta dos guardiões para protegê-lo. “Não queremos mais ser estatística, queremos providências do Poder Público, dos órgãos que estão cada vez mais sucateados exatamente para não fazerem a proteção dos povos que estão pagando com a própria vida por fazer o trabalho que é responsabilidade do Estado. Exigimos justiça urgente”.

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