OPINIÃO

Por que o ódio? Um diálogo muito atual entre Eisntein e Freud

Por Isabel Cristina de Moura Carvalho (Pesquisadora do CNPq/PPGAS/Ufrgs) / Publicado em 8 de outubro de 2018

 

Foto: Divulgação/Web

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Em 1991, escrevi um ensaio sobre a teoria pulsional, numa primeira tentativa de compreender a crise ecológica desde a perspectiva da psicanálise. Não pensei que, anos depois, voltaria a este ensaio com o mesmo sentimento de urgência, mas, desta vez, por um motivo menos planetário. Um observador atento à vida social não pode estar tranquilo com o mau tempo que se forma no horizonte. Refiro-me à escalada de destrutividade. A autorização da violência vem desenhando um ambiente propício às múltiplas expressões de ódio e de ressentimento. Uma operação reiterada pela estetização de gestos, imagens e enunciados que naturalizam a aplicação direta da força e, com isso, a conversão das representações da agressividade em atos.

Nestas eleições, um fenômeno emblemático é a campanha do candidato presidencial que assumiu o discurso do ódio como sua marca. Um dos ícones adotados é o gesto em que ele aparece com as duas mãos em forma de revólver, apontando na direção do expectador. Por que o ódio tem se mostrado um ideal de identificação tão potente? Por que as narrativas do matar, eliminar, exterminar encontram tanta recepção? O que resultará desta idealização de um Eu solitário e contra todos que depende, para sua realização, da extinção do Outro? Que quantidades de angústia e medo estariam projetando-se nesta fantasia de aniquilação do Outro? Até quando se sustentará a crença de que a agressão, ao ser mobilizada, recairá sempre sobre o Outro e nunca sobre si mesmo?

Para compreender o tempo que vivemos, vale revisitar o diálogo entre Einstein e Freud, no período da ascensão do Nazismo que, poucos anos depois, forçaria ambos a deixarem seus países. A pergunta de Einstein era: como seria possível controlar a evolução da mente humana, de modo a torná-la à prova do ódio e da destrutividade? Em sua resposta, Freud lembra que a civilização está longe de ser uma conquista estável. O laço social se configura na tensão permanente entre vida e morte, agressividade e amor, destruição e união. Essas forças, embora opostas, operam sempre fusionadas e o risco está justamente na predominância de apenas uma delas e na extinção da outra. Assim, se o desejo de aderir à guerra é efeito da pulsão destrutiva, a recomendação seria contrapor-lhe sua força antagonista, a pulsão de vida, pois tudo o que favorece o estreitamento dos vínculos emocionais entre os seres humanos­ atua contra a guerra. A convivência, para Freud, só se torna possível pela ação das forças agregadoras da pulsão de vida que, ao vincular os sujeitos, pelo laço amoroso, orienta a agressividade para o debate e a criação no plano das ideias. No sentido oposto, a predominância da agressividade conduz a uma espiral destrutiva que projeta inimigos em cada um que se aproxima e toma a alteridade como ameaça iminente à integridade do Eu. Um caminho que encontra na ilusão autoritária a esperança de livrar-se de seus próprios medos, alienando-se de si mesmo numa figura de mando, rude e punitiva.

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