MOVIMENTO

Mediação evita violência

Renato Hoffmann e Valéria Ochôa / Publicado em 8 de agosto de 1997

Um levantamento parcial realizado pela Comissão de Transportes e Habitação da Câmara de Vereadores (Cuthab), mostra que Porto Alegre tem, atualmente, 33 ocupações com processos de reintegração na Justiça, sendo nove com liminares de despejo concedidas. Ao todo, essas áreas abrigam 4.200 famílias. Mas a própria comissão admite que o universo dos sem-teto é maior, uma vez que não existe um cadastro atualizado.

Outro diagnóstico, do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), revela que 238.313 pessoas vivem em 57,8 mil subabitações na cidade – em média, 4,12 pessoas por moradia. Elas estão distribuídas em 301 becos, vilas ou núcleos; 246 loteamentos particulares, 362 públicos e 173 áreas de risco. De acordo com o Demhab, apenas para acompanhar o crescimento vegetativo da população, num ritmo de 2,4% ao ano, deveriam ser produzidas 2.314 unidades habitacionais a cada 12 meses. A autarquia municipal estima que metade dessa produção seria destinada ao reassentamento de vilas irregulares e moradores de áreas de risco. A outra metade atenderia a demanda por casas e lotes urbanizados.

Os investimentos em habitação popular ganharam prioridade máxima do Orçamento Participativo neste ano. O Demhab recebeu uma dotação de R$ 22 milhões, o que corresponde a um acréscimo de 266% em relação aos recursos do órgão em 1996. A meta da administração municipal é concluir o processo de regularização fundiária em 78 vilas na gestão do prefeito Raul Pont. Até o final do ano, 16 mil lotes deverão estar com o levantamento topográfico concluído, cerca de 8 mil reurbanizados e 500 com ações de usucapião ajuizadas. O programa beneficia 64 mil pessoas.

A falta de política habitacional para as camadas populares nos níveis federal e estadual vem sobrecarregando os municípios. As prefeituras se vêem obrigadas a arcar com o desgaste político das desocupações de áreas públicas e a intermediar as negociações com os proprietários privados. Por causa disso, a Cuthab, presidida pelo vereador José Valdir (PT), sugeriu ao Executivo a elaboração de um plano de emergência para enfrentar a situação.

Nos casos em que for impossível evitar a ocupação de uma área pública, o vereador sugere que o Município atue rápido para desimpedir o local, mas ao mesmo tempo se responsabilize pelo destino das famílias. “As iniciativas de desocupação de uma Administração Popular necessariamente devem se diferenciar das clássicas ações de despejo promovidas por governos e agentes não comprometidos com as camadas populares”, aconselha. Por isso mesmo, o movimento dos sem-teto trocou o enfrentamento pela negociação, aceitando a mediação da prefeitura através dos conselhos regionais e do Orçamento Participativo.

O presidente da Cuthab acredita que o custo social das desocupações pode ser atenuado através da busca de locais alternativos, da garantia de transferência e da reserva de vagas em escolas e creches para as crianças, e em albergues para os adultos. O vereador destaca o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo setor de negociações do Demhab, onde a intermediação nas relações entre ocupantes e proprietários vem trazendo bons resultados.

Um exemplo bem-sucedido disso é o Jardim Leopoldina, na zona norte da capital. Ocupado em 1987, o conjunto habitacional de 1096 unidades pertencia à construtora Guerino. Desde 1993, os ocupantes estavam ameaçados de despejo. Em 1995, a prefeitura se responsabilizou pelo financiamento de R$ 30 milhões junto à Caixa Econômica Federal (CEF). Os mutuários estão pagando as prestações com uma redução de 28,5% nos primeiros 36 meses. A diferença será compensada nas 264 parcelas restantes do contrato.

Criado em 1991, o Fórum Sindical da Habitação é outro instrumento da política habitacional da prefeitura de Porto Alegre. Até o final de 1996, o fórum estimulou a criação de 47 cooperativas habitacionais autogestinadas, envolvendo 4.700 famílias. Ao todo, essas sociedades adquiriram 521 mil metros quadrados de áreas destinadas à construção de moradias. O Demhab entra com assessoria técnica e jurídica.

Restinga reproduz drama dos Sem-terra

O movimento de luta pela moradia do bairro Restinga, um dos mais antigos de Porto Alegre, tem um cadastro de 1.200 famílias de sem-teto. Atualmente, a região tem quatro ocupações, duas em áreas particulares (Salso e Bita) e duas em terrenos da prefeitura (Caixa D`Água e Castelo). No total, são 3.500 famílias, quase 10 mil pessoas. Nos últimos anos, foram construídas 609 unidades na Restinga (Granja Esperança), com recursos da Caixa Econômica Federal.

Em março deste ano, a prefeitura recorreu à Justiça para desocupar uma parte da área do Distrito Industrial da Restinga que havia sido ocupada por 70 famílias. A maioria dos sem-teto da Restinga são filhos de famílias que foram para a região quando da construção dos conjuntos habitacionais pelo extinto BNH, na década de 70. Eles reproduzem na cidade o problema enfrentado pelos pequenos agricultores, que não têm terras para dividir com os filhos.

A organização do movimento na Restinga começou em 1992 e atua em três frentes: reassentamentos, regularização fundiária e busca de novos loteamentos. Em 1994, o movimento conquistou uma área de 56 hectares para implantação de 200 lotes urbanizados, através do Orçamento Participativo. Em 1995, o Demhab apresentou um projeto de construção de outros 464 lotes, sendo 50% para os moradores da Restinga, e 50% reservados para as famílias de outras áreas da cidade. No momento, os moradores discutem com o governo municipal uma proposta para transformar em lotes urbanizados (de 6×18 metros) uma área destinada à construção de 139 casas, o que possibilitaria o assentamento de 800 famílias.

Além disso, o movimento enfrenta o desafio de se organizar para a construção das casas nos 200 lotes conquistados em 1994. Uma das alternativas que vem sendo estudadas é a utilização de concreto pré-moldado, que baixa o custo da obra e diminui o tempo de construção. Os integrantes do movimento também estão avaliando o aproveitamento da mão-de-obra disponível na região, em função do grande número de desempregados. As famílias cadastradas são escolhidas para receber os títulos de propriedade de acordo com critérios preestabelecidos. Famílias com renda superior a cinco salários mínimos (R$ 600,00), que não morem na região, ou que já tenham possuído casa própria não são aceitas. A classificação na lista dos futuros proprietários é definida pela soma de pontos atribuídos aos seguintes critérios: participação na luta pela moradia, renda per capita (quanto menor a renda, mais pontos), mulher chefe de família (proteção às crianças), casal com filhos ou sem filhos (uma casa deve abrigar o maior número de pessoas possível) e inscrição mais antiga no Demhab. Alguns lotes deverão ser reservados a portadores de deficiência física e aos idosos.

Vicentinho é reeleito presidente da CUT

Da redação

O sindicalista Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, foi reeleito presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT). A eleição ocorreu no dia 17 de agosto, durante o 6? Congresso Nacional da CUT (6? Concut), realizado de 14 a 17 deste mês, em São Paulo. Vicentinho ficará mais três anos à frente da entidade. Um acordo entre as tendências majoritárias na CUT garantiu a vice-presidência para o bancário João Vaccari Neto, que ocupava a secretaria-geral no último mandato. Cinco chapas concorreram. A Articulação venceu com uma maioria de 52% dos votos.

É a primeira vez, desde a fundação da CUT, em agosto de 1983, que a vice-presidência não será ocupada por um trabalhador rural. O vice-presidente da direção passada, Altemir Tortelli, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jacutinga (RS), ficou com a Secretaria de Formação Sindical. A secretaria-geral vai ser administrada por João Felício, da Associação dos Professores do Estado de São Paulo (APEOESP).

Falta de tempo foi a justificativa pelo não cumprimento efetivo da pauta do 6? Concut, que reuniu 2.140 delegados sindicais de todo o país. O principal e mais polêmico ponto – estrutura e organização da CUT -, bem como as políticas permanentes e alterações estatutárias, foram transferidas para a plenária nacional da central, marcada para agosto do ano que vem.

O tempo permitiu discussões sobre as conjunturas nacional e internacional, a estratégia política, o plano de ação nacional, eleição da direção e do conselho fiscal. A organização de três grandes atos foram agendadas ainda para este ano. O Grito dos Excluídos, no dia 7 de setembro, manifestações em todo o país no dia 16 de setembro, durante o julgamento de José Rainha, e uma caminhada, na segunda quinzena de novembro, chamada provisoriamente de Marcha dos Sem…, que deverá reunir em torno de 100 mil excluídos – sem-casa, sem-terra, sem-educação, sem-emprego, sem-nada.

O coordenador da Secretaria de Formação do Sinpro/RS, Cássio Galvão Bessa, um dos delegados que representaram o Sinpro/RS no 6? Concut, critica a organização do encontro. Segundo ele, a estrutura montada não foi condizente com a importância do congresso. “Houve falhas na disciplina dos horários e no credenciamento, expõe.

Tribunal dos Povos em Porto Alegre

O Tribunal Permanente dos Povos realizará uma sessão regional em Porto Alegre, em janeiro do ano que vem, para debater a mortalidade materno-infantil na região Sul do Brasil. O Tribunal Permanente dos Povos é uma ONG com sede na Itália e já realizou cerca de 50 sessões em diversos países para tratar da violação dos direitos infantis. Segundo a coordenadora nacional do grupo de trabalho, Luiza Erundina (ex-prefeita de São Paulo), o Tribunal conseguiu modificar legislações nacionais em alguns países, para garantir a apuração e punição de maus-tratos contra menores.

O comitê de organização do evento, em Porto Alegre, foi instalado junto à Ordem dos Advogados e às entidades ligadas ao setor da infância e adolescência do Rio Grande do Sul.

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