MOVIMENTO

Bolsonaro incita ao etnocídio e ao genocídio de povos indígenas

Para o Conselho Indigenista, declarações do presidente evidenciam opção por neocolonialismo de ocupação e exploração dos territórios por meio do fundamentalismo religioso
Por Gilson Camargo / Publicado em 3 de fevereiro de 2020
Crianças da etnia Kaxinawá, na aldeia Água Viva, no Acre

Foto: Ricardo Stuckert

Crianças da etnia Kaxinawá, na aldeia Água Viva, no Acre

Foto: Ricardo Stuckert

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) reagiu com indignação às declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que na sexta-feira, 31, voltou a atacar ONGs e defensores dos direitos dos povos indígenas. Ao falar a apoiadores no cercadinho em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que “as questões indigenistas atrasam o país” e que o Cimi “presta um desserviço ao Brasil”. Em nota, o Cimi manifesta grave preocupação” e repudia com veemência “as recentes iniciativas do governo que afrontam a Constituição e a política sobre povos indígenas isolados e de recente contato no país. Para o organismo vinculado à Confederação dos Bispos do Brasil (CNBB) que foi fundado em 1972 para lutar pelos direitos dos povos indígenas, a incitação ao ódio e à discriminação pode provocar etnocídio e genocídio de povos isolados e de recente contato.

Lembrando que o ano passado foi marcado pelo maior número de assassinatos de lideranças indígenas, com sete execuções por fazendeiros e madeireiros ilegais, a e entidade afirma que Bolsonaro dá evidentes sinais de abandono à perspectiva técnico-científica e demonstra total falta de respeito ao direito de existência livre desses povos, com seus próprios usos, costumes, crenças e tradições, em seus territórios devidamente reconhecidos e protegidos (conforme o artigo 231 da Constituição Federal). E com isso faz a clara opção por “uma orientação neocolonialista e etnocida, de atração e contato forçados, com o uso do fundamentalismo religioso como instrumento para liberar os territórios destes povos à exploração por grandes fazendeiros e mineradores”.

Ao adotar este direcionamento, o governo Bolsonaro e os grupos econômicos e ‘investidores’ beneficiários desta política assumem, conjuntamente, a responsabilidade pelo potencial e iminente genocídio e etnocídio de povos indígenas no Brasil, prossegue o comunicado.

O Cimi também declarou repudia as agressões verbais do presidente Bolsonaro à entidade, que considera uma demonstração de completo despreparo e desequilíbrio emocional por parte do presidente, que servem de incentivo às ameaças e violências contra membros da organização que atuam junto aos povos em todas as regiões do país. “Mesmo diante dessas intimidações, o Cimi reafirma o compromisso inarredável e solidário com a vida, os direitos e os projetos de futuro dos povos originários do Brasil”.

Sônia Guajajara, membro da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil: “crimes são reflexo do ódio que vem sendo disseminado pela autoridade máxima do país contra nós, povos indígenas”

Foto: Isabel Clavelin/ONU Mulheres

Sônia Guajajara, membro da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil: “crimes são reflexo do ódio que vem sendo disseminado pela autoridade máxima do país contra nós, povos indígenas”

Foto: Isabel Clavelin/ONU Mulheres

GENOCÍDIO – Para o secretário executivo do Cimi, Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira a “fala do presidente foi muito desrespeitosa e ao mesmo tempo contribui para todo esse processo de violência contra os defensores dos direitos humanos no país”. Em entrevista ao Congresso em Foco, Oliveira afirmou que a entidade “responsabiliza o governo federal, na pessoa do presidente Jair Bolsonaro, por qualquer dano que venha a ser causado aos missionários do Cimi”.

A integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Sônia Guajajara, uma das maiores referências da luta dos povos indígenas do país, responsabilizou o presidente pelo assassinato a tiros de duas lideranças de sua comunidade, no início do mês, na BR 226, que corta a terra indígena do povo Guajajara no Maranhão. Firmino Prexede Guajajara e Raimundo Guajajara foram executados por ocupantes de um veículo quando retornavam de uma reunião de moradores da região. Quatro indígenas foram feridos no atentado. Num dos crimes contra lideranças indígenas que mais teve repercussão mundial, o líder indígena Paulo Paulino Guajajara, 26 anos, foi morto em 1º de novembro, em uma emboscada na Terra Indígena Araribóia, na região de Bom Jesus das Selvas, entre as aldeias Lagoa Comprida e Jenipapo, no Maranhão. “Esses crimes não são casos isolados, são reflexo do ódio que vem sendo disseminado pela autoridade máxima do país contra nós, povos indígenas. O presidente deveria cumprir a Constituição Federal e garantir a proteção às nossas vidas e ao meio ambiente. Infelizmente o que vemos é o contrário, um comportamento que não condiz com o de um presidente. Exigimos justiça. esses crimes não podem continuar impunes”, afirmou em vídeo publicado nas redes sociais.

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