OPINIÃO

Receita para tornar o país um pária internacional

A mistura de ignorância, obscurantismo, boçalidade e grotesco desafia a própria linguagem para definir Bolsonaro e seu séquito
Por Marco Aurélio Weissheimer / Publicado em 10 de julho de 2019
Jair Bolsonaro passeia pela cidade de Osaka, no Japão

Foto: Alan Santos/PR

Jair Bolsonaro passeia pela cidade de Osaka, no Japão

Foto: Alan Santos/PR

O Brasil, representado na figura de seu mandatário máximo, progressivamente, vai se tornando um pária na comunidade internacional de nações. E isso ocorre com a cumplicidade e protagonismo de uma casta de juízes, generais e outros altos oficiais das Forças Armadas, procuradores, banqueiros, industriais, empresários do comércio, do setor de serviços e do agronegócio. O alerta não parte de opositores internos ao governo Bolsonaro, mas de lideranças de alguns dos principais países do planeta, vários deles de perfil conservador. A mistura de ignorância, obscurantismo, boçalidade e grotesco desafia a própria linguagem para definir Bolsonaro e seu séquito. O que poderia parecer um exagero de linguagem e de adjetivação vai se confirmando, e se superando, a cada semana. A recente visita do presidente brasileiro ao Japão para a reunião do G20, grupo que reúne as principais economias do mundo, forneceu novas e gritantes evidências de como um país pode ser destruído por sua própria “elite”.

No dia 26 de junho, a chanceler alemã, Angela Merkel, disse, durante sessão no Parlamento em Berlim, que via “com grande preocupação” a situação no Brasil sob o governo de Jair Bolsonaro. Ela descreveu essa situação como “dramática”. “Eu vejo com grande preocupação a questão da atuação do novo presidente brasileiro”, afirmou Merkel, observando que pretendia ter uma “conversa direta” com Bolsonaro durante o encontro do G20, no Japão, sobre violações a direitos humanos e ao meio ambiente que estão acontecendo no Brasil. A fala de Merkel foi em resposta a um questionamento feito pela deputada Anja Hajduk, do Partido Verde, sobre a conveniência de a Alemanha seguir nas negociações de livre comércio entre União Europeia e Mercosul, considerando as crescentes violações de direitos que estão ocorrendo no Brasil.

Questionado sobre as palavras de Merkel, durante a viagem ao Japão, Bolsonaro ficou irritado, respondeu que a Alemanha “tinha muito a aprender com o Brasil”, bateu boca com jornalistas e abandonou a entrevista que concedia à imprensa. Bolsonaro não explicitou quais seriam as lições que o Brasil tem a dar à Alemanha. Na chegada ao Japão, excluído das tradicionais reuniões preparatórias que ocorrem antes dos encontros do G20, foi passear com assessores e comer um churrasco em Osaka.

No dia 27 de junho, foi a vez de o presidente da França, Emmanuel Macron, mandar um recado a Bolsonaro. Macron disse que não assinaria nenhum acordo comercial com o Brasil se o presidente brasileiro retirar o país do acordo climático de Paris. Essa decisão, acrescentou, poderia afetar também as negociações comerciais entre União Europeia e Mercosul. Antes de iniciar a reunião do G20, o presidente francês comentou a jornalistas: “Se o Brasil deixar o Acordo de Paris, no que nos diz respeito, não poderemos assinar um acordo comercial com eles. Por uma simples razão: estamos pedindo aos nossos agricultores que parem de usar pesticidas, estamos pedindo a nossas empresas que produzam menos carbono, que tenha um custo de competitividade”.

Após as declarações de Macron, o Itamaraty e a Presidência da República chegaram a informar que uma reunião bilateral de Bolsonaro com o presidente francês havia sido cancelada. Assessores de Macron, porém, disseram que não havia nenhuma reunião bilateral marcada entre os dois. Cerca de quatro horas após o governo brasileiro ter anunciado o cancelamento, Bolsonaro e Macron tiveram uma conversa informal de alguns minutos.

No mesmo dia, a imagem do Brasil vivia outro “constrangimento”, para usar uma palavra amena, desta vez na Organização das Nações Unidas. A diplomacia brasileira, seguindo orientação do governo Bolsonaro, anunciou que era contrário à presença do termo “gênero” nas resoluções da organização. A proposta do governo brasileiro teve apoio da Arábia Saudita e foi rechaçada por representantes de países como Noruega, França, Finlândia, Dinamarca e Suíça, que também participavam da reunião.

Tudo isso ocorreu em meio ao escândalo da prisão de um militar brasileiro, que integrava a comitiva de Bolsonaro, com 39 kg de cocaína, na Espanha. “Podia não ter acontecido, né? Falta de sorte ter acontecido justamente na hora de um evento mundial”, lamentou o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que se eximiu de qualquer responsabilidade sobre o comportamento do integrante da comitiva presidencial. E assim segue o Brasil, dando lições ao mundo. Podia não ter acontecido, né?

 

 

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