AMBIENTE

Litoral brasileiro tem retração de praias e dunas e crescimento de manguezais

Radiografia dos quase 7,5 mil quilômetros de litoral feita pelo MapBiomas mostra que o país perdeu 15% de praias para a especulação imobiliária, silvicultura, agricultura e pecuária
Por Gilson Camargo / Publicado em 18 de novembro de 2022

Foto: Prefeitura de Balneário Camboriu/ Divulgação

Extensão da faixa de areia em Camboriu, Santa Cararina: a costa brasileira perdeu 457 mil hectares de litoral para a especulação imobiliária e agronegócio

Foto: Prefeitura de Balneário Camboriu/ Divulgação

A costa brasileira tem 7.491 quilômetros de extensão, uma das 20 maiores áreas litorâneas do planeta. Essa vastidão marcada pela biodiversidade vem perdendo faixas de areia, com a retração de praias e dunas.

O cenário de praias e dunas arenosas sem cobertura vegetal ao longo do litoral brasileiro é distinto e tem 47% de sua área localizada em unidades de conservação.

Essas áreas minguaram de 457 mil hectares em 1985 para 389 mil hectares em 2021, o que representa uma retração de 15%.

Entre os vetores que levaram a essa perda de 68 mil hectares está a pressão do mercado imobiliário e o consequente avanço de infraestruturas urbanas (11%), a silvicultura (7,4%), as pastagens e mosaicos de agricultura e pecuária (10%).

Berçário de inúmeras espécies marinhas, os manguezais que se estendem por toda a costa brasileira, do Amapá até Santa Catarina, em contrapartida, cresceram nesse período.

Entre 1985 e 2021, a área total de mangue apresentou uma expansão de 4%, passando de 970 mil hectares para 1,11 milhão de hectares.

O levantamento é do MapBiomas, coletivo de universidades, ONGS e empresas de tecnologia voltadas ao monitoramento das transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil com vistas à conservação e ao manejo sustentável dos recursos naturais e combate às mudanças climáticas.

Com o auxílio de imagens de satélite e recursos de inteligência artificial, o MapBiomas fez um raio-X da costa litorânea, que engloba praias, dunas, manguezais, apincus e áreas de aquicultura e salicultura.

Também foram mapeados municípios no interior do Brasil com grandes areais.

“Os números mostram uma relativa estabilidade nessas formações naturais, com alguns ganhos em manguezais e a mesma tendência de perda de praias e dunas”, aponta o estudo.

Manguezais

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Manguezais da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapi-Mirim e Estação Ecológica da Guanabara, região hidrográfica da Baía de Guanabara

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Amapá, Pará e Maranhão respondem por 80% da cobertura de manguezais do país e sua configuração explica esse bom resultado.

“Os manguezais do norte crescem sob um regime de macromaré, cujo nível de água tem variação diária superior a quatro metros, e desenvolvem-se sobre uma planície de lama que chega a medir 30 quilômetros de largura, ocupada por árvores de até 30 metros de altura”, explica o geógrafo Pedro Walfir, pesquisador do Instituto Tecnológico Vale Desenvolvimento Sustentável e integrante da equipe de mapeamento da zona costeira do MapBiomas.

Segundo ele, esse tipo de cobertura natural torna esse ecossistema naturalmente resiliente às mudanças antrópicas.

O mangue é berçário de inúmeras espécies marinhas: 70 a 80% dos peixes, crustáceos e moluscos que a população consome precisam desse bioma em alguma fase de suas vidas.

Arte: MapBiomas

Arte: MapBiomas

Diversas espécies de peixes economicamente importantes utilizam os mangues como área de reprodução e depois voltam para o mar. Os manguezais também são importantes para proteger a costa da erosão marinha.

Entre as formações naturais sobre as quais o mangue se expande estão os apicuns – superfícies dinâmicas, hipersalinas e associadas ao regime de marés.

Entre 1985 e 2021, os apicuns passaram de 57 mil para 54 mil hectares de área no Brasil. O Maranhão concentra aproximadamente 60% da superfície de apicuns do país – os manguezais que são fonte de susbsistência para as populações ribeirinhas na região vem sendo degradado pela degradação ambiental decorrente de obras na costa.

A maior parte dessas formações (70%) encontra-se dentro de alguma das 340 Unidades de Conservação da Zona Costeira Brasileira.

Apesar disso, entre 1985 e 2021, 1,3 mil hectares de apicuns foram convertidos para atividades de aquacultura que, junto com os 531 hectares perdidos para infraestruturas urbanas, representa o principal risco para este tipo de formação natural.

“Apicuns, assim como os manguezais, são localmente dinâmicos, intercalando perdas e ganhos de magnitude aproximadas ao longo da série temporal. São processos de transformação natural”, explica César Diniz, da equipe de mapeamento de zona costeira do MapBiomas.

“Porém quando há a conversão para infraestrutura urbana ou aquacultura, essa dinâmica é interrompida: não há volta para a formação original”, completa.

Aquicultura avança sobre o litoral

A aquicultura foi a ocupação da zona costeira brasileira que mais cresceu nos últimos 37 anos.

A atividade teve um aumento de 36% entre 1985 e 2021, passando de 36 mil hectares para 56 mil hectares no país.

A atividade expandiu-se principalmente sobre superfícies de água (28%), mosaico de agricultura ou pastagem (25%) e formação savânica (14%), com nítida preferência por regiões não vegetadas, como apicuns ou, quando vegetadas, de porte arbustivo.

O Rio Grande do Norte, com 67%, e Ceará, com 15,4%, concentram 82% da área de salicultura/aquicultura no Brasil.

Mossoró, no Rio Grande do Norte, possui a maior área de aquicultura/salicultura no país, com aproximadamente 11 mil hectares, o dobro da área urbanizada do município.

Praias, dunas e areais perdem 15% de área

O cenário de praias e dunas arenosas sem cobertura vegetal no litoral brasileiro é distinto: com 47% de sua área está em unidades de conservação, as quais minguaram de 457 mil hectares, em 1985, para 389 mil hectares em 2021 – uma retração de 15%. Foram 68 mil hectares suprimidos por vetores como a pressão do mercado imobiliário e o avanço de infraestruturas urbanas (11%), a silvicultura (7,4%), as pastagens e mosaicos de agricultura e pecuária (10%).

“Essa perda é preocupante, porque praias e dunas têm papel estratégico no controle da erosão costeira e preservação da biodiversidade”, explica Diniz.

“A praia e a duna normalmente protegem os manguezais das ações das ondas, criando um ambiente calmo, onde a lama pode ser depositada e colonizada pela vegetação de mangue”, detalha.

Os Lençóis Maranhenses e o Cordão Dunar do Rio Grande do Sul são as duas feições arenosas contíguas de maior extensão no Brasil.

Juntos, respondem por 51% da extensão de praias e dunas do país.

Porém, não há areais e dunas apenas no litoral: segundo o MapBiomas, dos 10 municípios com maior extensão desse tipo de cobertura, dois ficam no interior do país: Pilão Arcado e Xique-Xique, ambos na Bahia. O município líder é Barreirinhas, no Maranhão.

Com informações do MapBiomas.

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