ECONOMIA

PEC 186 é aprovada em 1º turno, mas segue debate na Câmara

A votação em segundo turno ocorre nesta quinta-feira, 11, com destaques do governo e da oposição; a PEC condiciona o pagamento do auxílio emergencial fora do teto de gastos a arrocho fiscal
Por César Fraga / Publicado em 11 de março de 2021
Sessão do Plenário da Câmara dos Deputados retomará a votação do 2º turno nesta quinta-feira, 11

Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias

Sessão do Plenário da Câmara dos Deputados retomará a votação do 2º turno nesta quinta-feira, 11

Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias

Na madrugada desta quinta-feira, a Câmara dos Deputados concluiu a votação, em 1º turno, da Proposta de Emenda à Constituição 186/2019 apelidada de PEC Emergencial. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), convocou sessão extraordinária para as 10 horas desta quinta-feira, 11,  para a votação da proposta em segundo turno. O pedido da base governista foi aprovado para dispensar o prazo de cinco sessões do Plenário para votar a PEC em segundo turno. Acompanhe em tempo real.

A PEC 186 condiciona o pagamento do auxílio emergencial em 2021 pelo governo federal, com R$ 44 bilhões, por fora do teto de gastos a arrocho fiscal.  A PEC impõe mais rigidez na aplicação de medidas de contenção fiscal, controle de despesas com pessoal e redução de incentivos tributários.

São 11 destaques a ser analisados. Ainda assim a presidência da casa pretende vencer a pauta ainda na quinta-feira, conforme fala do próprio Artur Lira antes do início da sessão plenária.

Modificação no texto

Conforme acordo entre o governo e a maior parte dos partidos da base aliada, um destaque a ser apresentado no segundo turno de votação retirará do texto a proibição de promoção funcional ou progressão de carreira de qualquer servidor ou empregado público, um dos pontos da PEC criticados pela bancada de militares e policiais.

Esse destaque vai contemplar ainda os servidores da União, inclusive no caso de se decretar estado de calamidade pública de âmbito nacional.

Acordo

O acordo surgiu depois da perspectiva do governo de que seria aprovado destaque do PT retirando todas as restrições colocadas pela PEC a estados e municípios quanto às despesas com pessoal.

Para o relator, deputado Daniel Freitas (PSL-SC), o acordo foi importante para preservar outros pontos da PEC. “O governo entende que vai abrir mão mesmo prejudicando de forma substancial algumas questões desta PEC para permitir as progressões e as promoções para todas as categorias”, explicou.

Auxílio

O valor total gasto com o auxílio poderá até ser maior, mas somente os R$ 44 bilhões poderão ficar de fora do teto de gastos (Emenda Constitucional 95, de 2016) e da meta de resultado primário (estimada em déficit de R$ 247 bilhões).

Sua captação com títulos públicos não precisará seguir a regra de ouro, que proíbe o governo de contrair dívidas para o pagamento de folha salarial e manutenção de órgãos públicos e de programas sociais, entre outros compromissos.

A primeira leva de pagamentos do auxílio chegou a R$ 292 bilhões para cerca de 68 milhões de pessoas, em duas rodadas: na primeira, foram pagas parcelas de R$ 600 por cinco meses; na segunda, chamada de “auxílio residual”, foram parcelas de R$ 300 durante quatro meses e com um público-alvo menor.

Para 2021, segundo o governo, o auxílio será de R$ 175 a R$ 375 por quatro meses (março a junho). Para a família monoparental dirigida por mulher, o valor será de R$ 375; para um casal, R$ 250; e para o homem sozinho, de R$ 175.

Arrocho fiscal e gatilhos

Para a União, medidas de contenção de despesas com pessoal e com isenções tributárias serão acionadas quando for atingido um gatilho relacionado às despesas obrigatórias.

No caso de estados, Distrito Federal e municípios, por causa da autonomia federativa, as medidas serão facultativas. Mas se todos os órgãos e poderes do ente federado não adotarem todas as medidas, o estado ou município em questão ficará impedido de obter garantia de outro ente federativo (normalmente da União) para empréstimos (internacionais, por exemplo), além de não poder contrair novas dívidas com outro ente da Federação ou mesmo renegociar ou postergar pagamentos de dívidas existentes.

A PEC 186/19 prevê ainda que uma lei complementar sobre sustentabilidade da dívida poderá autorizar a aplicação dessas restrições. Na lei devem ser definidos, por exemplo, níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida e planejamento de venda de estatais para reduzir seu montante.

Manutenção de fundos

O único destaque aprovado pelo Plenário no 1º turno retirou da proposta toda a parte que proibia a vinculação de qualquer receita pública a fundos específicos. Foram 302 votos contra o destaque, mas o mínimo para manter o texto são 308. Houve 178 votos a favor.

Com isso, a Constituição Federal continua com a redação atual no dispositivo que proíbe apenas a vinculação de impostos aos fundos, com algumas exceções.

Superávit

Entretanto, outro artigo relacionado ao tema continua no texto aprovado, permitindo ao Executivo usar, até o fim de 2023, o superávit financeiro dos seus fundos públicos para pagar a dívida pública.

Ficam de fora os fundos públicos de fomento e desenvolvimento regionais e, como o trecho da Constituição sobre vinculação não foi mudado, também não podem ser usados o Fundeb e os fundos de atividades da administração tributária.

A medida vale inclusive para estados e municípios, mas se o ente federado não tiver dívida pública para amortizar, o dinheiro será de livre aplicação.

Auxílio irrisório

PEC 186 permite, entre outras coisas, que o auxílio emergencial seja financiado com créditos extraordinários, que não são limitados pelo teto de gastos. As despesas com o programa não serão contabilizadas para a meta de resultado fiscal primário e também não serão afetadas pela chamada regra de ouro — mecanismo que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, de custeio da máquina pública.

Na avaliação de Maria Lucia Fattorelli, do Auditoria Cidadã da Dívida, o valor teto para auxílio emergencial anteriormente aprovado no Senado e mantido no 1º turno da Câmara é “ridícudo”. O programa ficará limitado a um custo total de R$ 44 bilhões. Quantia que, segundo ela, entrou no texto de última hora para impedir que o valor fosse destacado e votado.  Durante a votação anterior, no Senado, foi rejeitado o destaque do PT que pedia a supressão do limite. Foram 55 votos contra o destaque. Eram necessários 49 votos.

“A infame: PEC 186 rouba R$ 1,4 trilhão que temos na Conta Única do Tesouro, dinheiro que poderia estar sendo destinado ao pagamento do auxílio emergencial desde janeiro! Destina essa bolada para a chamada dívida, assim como todo o sacrifício do Ajuste fiscal: cortes, privatizações!”, explica a auditora.

Para Fattorelli, o valor que limita o programa de auxílio emergencial é ridículo diante da quantia que o Brasil tem em caixa, e que beira os R$ 5 trilhões.

“Temos quase R$ 5 trilhões na gaveta! R$ 1,289 trilhão na conta única do Tesouro Nacional, R$ 1,836 trilhão em reservas internacionais, R$ 1,393 trilhão de sobra de caixa dos bancos parados no Banco Central rendendo juros somente aos bancos, às custas do povo”, explica a auditora.

Dívida pública acima de todos

Para Maria Lucia Fattorelli, em diversos dispositivos da PEC 186 está explícito o privilégio da chamada dívida pública sobre todos os demais gastos e investimentos orçamentários, invertendo completamente a lógica da CF/88. Estarão irremediavelmente jogados para plano inferior a dignidade da pessoa humana (Art. 1º da CF), assim como os objetivos fundamentais elencados no Art. 3º da CF: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional e a erradicação da pobreza, da marginalização e das desigualdades sociais e regionais.

Segundo ela, trata-se de uma profunda alteração do texto constitucional, a Constituição Federal  “assume de vez, textualmente, a condição de constituição do mercado, e é completamente aviltada em sua lógica”.

Rejeição à PEC

A orientação passada pela Auditoria Cidadã da Dívida aos deputados foi de que rejeitem a PEC 186. Conforme, Fattorelli a proposta do governo se trata de uma chantagem do governo para aprovar o auxílio totalmente sujeitada a interesses do mercado financeiro e atrelada a arrocho fiscal. A deputada Luiza Erundina (Psol/SP), chegou a sugerir que a proposta mudasse de nome para PEC do Arrocho Fiscal. Na mesma linha, falou a deputada Miaria do Rosário (PT/RS). O entendimento da oposição é que mistura auxílio emergencial com reforma tributária. Não faltou quem usasse a expressão “jabuti” para definir o atrelamento dos temas.

Resumo da PEC 186/2019

– Inclui os gastos com pessoal inativo e pensionistas no teto de despesa dos Legislativos municipais. Atualmente, esse teto inclui os subsídios dos vereadores, mas exclui gastos com inativos. A despesa não pode ultrapassar o somatório da receita tributária e das transferências constitucionais.

– Inclui os pensionistas entre as despesas com pessoal que não podem exceder os limites estabelecidos em lei complementar. Atualmente, a Constituição prevê apenas que a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos estados, do DF e dos municípios não pode ultrapassar esse limite, sem mencionar os pensionistas.

– Inclui no artigo constitucional que trata da administração pública a determinação de que órgãos e entidades façam, individual ou conjuntamente, uma avaliação das políticas públicas e divulguem os resultados.

– Veda a transferência a fundos de recursos oriundos dos repasses feitos aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, os chamados repasses duodecimais. Se houver sobra de recursos, ela deve ser restituída ao caixa único do Tesouro do ente federativo ou será deduzida das próximas parcelas de repasse.

– Inclui na lei a previsão de uma lei complementar para regulamentar a sustentabilidade da dívida pública. Essa lei deverá especificar indicadores de apuração; níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida; trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação; medidas de ajuste, suspensões e vedações; e planejamento de alienação de ativos com vistas à redução do montante da dívida. A lei poderá autorizar ações de ajuste fiscal em caso de crise nas contas públicas. União, estados, Distrito Federal e municípios também deverão conduzir suas políticas fiscais de forma a manter a dívida pública em níveis que assegurem sua sustentabilidade, conforme a ser estabelecido pela lei complementar.

– Modifica o texto constitucional que trata da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para determinar que cabe a ela estabelecer as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância com trajetória sustentável da dívida pública. Inclui um parágrafo para determinar que as leis de que trata o artigo 165 da Constituição (Plano Plurinual, LDO e Lei Orçamentária Anual) devem observar os resultados do monitoramento e da avaliação das políticas públicas.

– Estende de 2024 para 2029 o prazo para que estados e municípios paguem seus precatórios.

Leia também:

PEC 186 coloca arrocho fiscal na Constituição e reduz auxílio emergencial

Se a PEC 186 for aprovada o Brasil ficará totalmente submisso aos interesses do mercado

Comentários