JUSTIÇA

MPF denuncia magistrada e seus filhos por formação de quadrilha

O MPF faz a sexta denúncia da Operação Faroeste, agora contra a desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia, seus dois filhos e três advogados por esquema bilionário de grilagem e vendas de sentenças
Por César Fraga / Publicado em 4 de janeiro de 2021
A desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ/BA) Lígia Maria Ramos Cunha (foto), seus filhos Arthur e Rui Barata, além de outros três advogados responderão por organização criminosa

Foto: Reprodução/TV Bahia/Web

A desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ/BA) Lígia Maria Ramos Cunha (foto), seus filhos Arthur e Rui Barata, além de outros três advogados responderão por organização criminosa

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Como desdobramento da Operação Faroeste, que investiga quadrilha integrada por magistrados, advogados e agroempresários por fraudes na legalização criminosa da grilagem de terras na Bahia, o  Ministério Público Federal (MPF) denunciou na noite do último sábado, 2 de janeiro, a desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ/BA) Lígia Maria Ramos Cunha. Além dela, também seus filhos Arthur e Rui Barata e mais três advogados. A família da magistrada responderá por organização criminosa. A denúncia já  é a sexta apresentada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) desde a deflagração da Operação, em 2019. O esquema de grilagem envolve

A investigação apura crimes como a participação de magistrados para beneficiar interessados em decisões como as que permitiram a regularização indevida de terras na região oeste do estado. Em contrapartida, os agentes públicos recebiam propinas milionárias.

Acusações

No caso específico, detalhado na petição enviada ao relator do caso no STJ, o ministro Og Fernandes, os envolvidos são acusados de receber R$ 950 mil em vantagens indevidas em um esquema que incluiu decisões da desembargadora Lígia Cunha em quatro processos ( 0000862-53.2013.8.05.0081, 8020020-31.2018.8.05.0000, 8008430-23.2019.8.05.0000 e 8016374-13.2018.8.05.0000). Em três deles, a magistrada, que está presa preventivamente desde o dia 14 de dezembro, era a relatora.

Na denúncia, a subprocuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo detalha a participação de cada um dos integrantes do esquema com base em provas obtidas durante as investigações preliminares. Parte dessas provas teve como ponto de partida informações e documentos entregues por Júlio César Cavalcanti Ferreira, que firmou acordo de colaboração premiada com o MPF.

Magistrada ordenou destruição de provas

Júlio Cesar contou aos investigadores como funcionava o esquema que, conforme relatou, teve início em agosto de 2015, com a promoção de Lígia Ramos para o cargo de desembargadora. A atuação criminosa do grupo persistiu até dezembro de 2020, mesmo com as sucessivas fases da Operação Faroeste. A denúncia menciona provas de que a magistrada atuou para obstruir as investigações, determinando, por exemplo, que uma assessora destruísse provas dos crimes. Além da desembargadora, dos filhos e de Júlio César, foram denunciados Diego Freitas Ribeiro e Sérgio Celso Nunes Santos.

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De acordo com a petição, quando atuava como assessor no TJ, Júlio César foi procurado por Diego para que fizesse a prospecção de casos que poderiam ser negociados pelo grupo. Pelo trabalho, o então servidor recebia, em 2016, entre R$ 5 mil e R$10 mil.

“Posteriormente, percebendo a lucratividade da missão, sua extensa rede de contatos no segundo grau de jurisdição e anseio de ficar rico, como seus comparsas, Júlio César coloca, no ano de 2018, sua própria banca de advocacia, ganhando, a partir de então, percentual sobre o valor da propina pactuada”, destaca um dos trechos do documento.

Movimentações financeiras milionárias

Dados da Unidade de Inteligência Financeira (UIF) elevaram movimentação de R$ 24,5 milhões (R$ 24.526.558,00) por Júlio César no período investigado. Em apenas um dos episódios casos relatados pelo colaborador, teria sido acertado o pagamento de R$ 400 mil em propina. Nesse caso, Júlio César ficou com R$ 100 mil e os outros R$ 300 mil foram repassados aos filhos da desembargadora que, em contrapartida deveria “acompanhar o referido julgamento e traficar influência junto aos respectivos julgadores”, garantindo o provimento de um recurso de interesse dos integrantes do grupo.

Ainda em relação às provas da existência e do alcance da organização criminosa, a denúncia menciona intensa troca de ligações telefônicas entre os envolvidos, sobretudo em datas próximas ou posteriores às decisões tomadas pela desembargadora bem como relacionadas aos dias em que foram feitas transferências financeiras ou repasse de dinheiro em espécie. Apenas do telefone de Rui Barata (filho da desembargadora) foram identificadas 106 ligações pra os demais investigados no período entre outubro e dezembro de 2018. Para o MPF, essas constatações deixam claro a estabilidade da atuação criminosa.

Pedidos – Na denúncia, o MPF requer que os seis envolvidos sejam condenados por organização criminosa, conforme previsão da Lei 12.850 e que, em caso de condenação, seja decretada a perda da função pública, no caso dos que têm essa condição. Também foi pedido para que os envolvidos paguem, de forma solidária, indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 950 mil.

Operação Faroeste iniciou em 2019

Há suspeitas de que a área objeto de grilagem supere os 360 mil hectares no oeste da Bahia, altamente valorizado, e de que o grupo envolvido na dinâmica ilícita tenha movimentado cifras bilionárias

Foto: Reprodução/Divulgação

Há suspeitas de que a área objeto de grilagem supere os 360 mil hectares no oeste da Bahia, altamente valorizado, e de que o grupo envolvido na dinâmica ilícita tenha movimentado cifras bilionárias

Foto: Reprodução/Divulgação

Operação Faroeste foi deflagrada pelo MPF em novembro de 2019, com a instauração do Inquérito 1.258/DF. O objeto inicial era a existência de suposto esquema de venda de decisões no Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) com o envolvimento de pelo menos quatro desembargadores.

O esquema criminoso criado por Adailton Maturino dos Santos – que passou a contar com a participação de outros magistrados/as – consistia na legalização de terras griladas no Oeste do estado. A orcrim conta, ainda, com laranjas e empresas para dissimular os benefícios obtidos ilicitamente. Há suspeitas de que a área objeto de grilagem supere os 360 mil hectares e de que o grupo envolvido na dinâmica ilícita tenha movimentado cifras bilionárias.

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