POLÍTICA

Crime eleitoral em publicidade para Bolsonaro

Plataforma de notícias inglesa no Brasil estimula leitores a clicar em espaço destinado ao candidato, único a contar com canal específico no veículo
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 5 de outubro de 2018

Foto: Reprodução site Blasting News

Antes das 8 horas da quarta-feira, 4: convite para leitores seguir Canal de Bolsonaro

Foto: Reprodução site Blasting News

O braço brasileiro da inglesa Blasting News, plataforma de jornalismo digital com presença em 35 países e nos cinco continentes, tem realizado estímulos aos seus leitores no Brasil para clicar em espaço destinado a Jair Bolsonaro, único candidato à presidência que conta com canal específico no veículo. Segundo especialista em direito eleitoral, a prática é ilegal. Procurada pelo Extra Classe por dois canais dispostos para contato, a empresa até o momento não se manifestou.

Visto na manhã desta quinta-feira, 4, em matéria que registrava sete Projetos de Lei considerados os mais absurdos do Brasil, a revista on-line apresentava um botão de direcionamento para um canal exclusivamente dedicado ao candidato do PSL, com a seguinte chamada publicitária “Se você gosta deste artigo, por que não dar uma olhada no Canal Jair Bolsonaro, para receber todas as últimas notícias e vídeos sobre o assunto e também para interagir com sua comunidade”. Por volta das 8 horas o nome de Jair Bolsonaro deu lugar a Eleições.

O nome de Jair Bolsonaro, conforme verificado pelo Extra Classe, retornou ao Blasting News as 21 horas da mesma quinta-feira, só que desta vez com força total. Uma hora antes do último debate eleitoral entre os candidatos à presidência da República, quatro banners espalhados entre a matéria convidavam para seguir o canal dedicado ao capitão que prometeu fazer uma live no mesmo horário que seus adversários debatiam na Globo.

 

Dupla irregularidade

Foto: Reprodução site Blasting News

Passado das 8 horas, o anúncio da Blasting News troca o nome do candidato para Eleições. Bolsonaro volta a nominar o Canal às 21 horas

Foto: Reprodução site Blasting News

Para a advogada Carolina Lobo, especialista em direito eleitoral e integrante da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais (OAB/MG), a propaganda feita no portal é totalmente irregular pois a legislação não permite esse tipo de publicidade em sites ou blogs, mas somente o impulsionamento em redes sociais como Facebook, Instagram, Youtube e buscador Google. Na realidade, afirma Carolina, a lei “é bem específica e deixa claro que somente o impulsionamento e não conteúdo editorial é permitido na internet”.

Mais grave ainda, destaca a Carolina Lobo, a legislação proíbe expressamente “o recebimento direto ou indireto de doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de entidade estrangeira”, destacando que a Blasting News não é uma empresa nacional. Para Carolina, a propaganda de Bolsonaro na plataforma é duplamente vedada. “Temos dois ilícitos, propaganda irregular e recebimento de doação de fonte vedada”, afirma ao registrar que se Bolsonaro não contratou o serviço o recebeu de uma empresa que não poderia fazer a doação.

Ao verificar a plataforma da Blasting News a pedido do Extra Classe, Marton Eduardo da Costa, especialista em matemática computacional, acredita que tudo indica que “o site vai alterando diariamente em certos períodos de tempo as tags (links)”. Com isso é possível aos responsáveis pela administração da plataforma redirecionar para uma ou outra matéria de seu interesse. Isso, conforme Costa, se chama Pointer e “não deixa de ser uma propaganda”, considera.

Costa ainda apresenta em sua análise uma máxima do universo da Tecnologia da Informação: “a programação aceita tudo”. Para ele, pode-se mesmo, dentro de uma matéria ou artigo colocar links em palavras chaves e quando o usuário clicar é redirecionado para onde o administrador quiser. “Se o dono do meio de comunicação não tiver ética, ferrou”, avisa Costa que reafirma que é possível que a qualquer momento os links de uma página podem ser alterados na busca de redirecionar usuários. “Inclusive para Bolsonaro, como estava de manhã, que depois passou para eleições e voltou novamente para Bolsonaro à noite”, afirma.

Falta de pluralidade

Foto: Reprodução site Blasting News

Candidato do PSL é o único político com Canal na versão brasileira da Blasting News

Foto: Reprodução site Blasting News

A Blasting News promete em seu processo de jornalismo “oferecer aos seus leitores os dois lados de cada história”. No entanto, a amostragem de notícias publicadas na versão brasileira da plataforma mostra que a pluralidade prometida não é entregada.

Além de entre todos os políticos somente Bolsonaro ter um canal especialmente dedicado, nas notícias de política verificadas às 19h10 desta quinta-feira, 4, o candidato à presidência pelo PSL tinha 29 ocorrências contra seis de Ciro Gomes, quatro de Fernando Haddad, duas de Geraldo Alckmin, uma para Marina Silva e uma para João Amoedo. As ocorrências dos nomes na página podem estar no link de uma notícia ou seu subtítulo.

Empresa líder

Sediada em Londres e com escritório em cinco países, a empresa criada em 2013 é considerada líder mundial em seu modelo de negócio, que funciona de forma parecida com a Wikipédia e já conta com publicações em 25 idiomas.

Com mais de 300 milhões de visualizações de vídeos mensais, 26 mil artigos e 16 mil notícias por vídeo publicadas por mês, realizados de forma colaborativa, a empresa afirma que a plataforma tem uma rigorosa curadoria. De acordo com informes recentes da Blasting News, uma equipe de 200 curadores seniors de conteúdo, chamados de “Senior Blasters” podem aprovar, rejeitar ou alterar o conteúdo para garantir que informações falsas, conteúdo ofensivo e notícias sensacionalistas não acabem publicadas.

Apesar do esforço alegado pela plataforma, a Blasting News tem sido constantemente acusada de disseminar fake news (notícias falsas) ou de qualidade duvidosa. A plataforma paga criadores de conteúdo que nem sempre são jornalistas profissionais, os chamados “social blaster”, pessoas que avalia ter “influência digital”.

Nota da editora: Não reproduzimos os links do site citado na matéria para não incentivar crime eleitoral.

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