POLÍTICA

Brasil se iguala a países ultraconservadores em políticas antigênero

Para especialista, o país optou por uma posição estratégica de política contra as mulheres que tem ramificações e financiamento internacional
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 25 de agosto de 2021

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, com Bolsonaro e o ex-ministro da Cidadania, Osmar Terra

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Enquanto a violência e o medo provocados pela ocupação do Talibã no Afeganistão desperta solidariedade e revolta no mundo ocidental e a preocupação com os direitos das afegãs, o Brasil aprofunda suas contradições em relação às políticas de gênero.

O avanço dos feminicídios e das diversas formas de violência contra mulheres se somam a retrocessos nas políticas de Estado no país sob o governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Por conta disso, o Brasil se alinhou aos países ultraconservadores e violentos especialmente com as meninas e mulheres, como o próprio Afeganistão, a Líbia e o Congo – só para citar as três nações que mais discriminam e violam direitos femininos –, e os brasileiros se isolam cada vez mais na comunidade internacional. O exemplo mais recente: no dia 17 de julho, o país se absteve na votação de resolução na ONU contra a discriminação de gênero.

Para a advogada Luciana Boiteaux, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o que está ocorrendo não é um fato isolado e revela que o Brasil optou por uma posição estratégica de uma política antigênero que tem ramificações e financiamento internacional. “Isso é muito preocupante”, diz Luciana, que atua em diversas frentes jurídicas no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a pauta de gênero.

Segundo a professora e advogada, o protagonismo do Brasil se intensificou a partir do fim do governo Trump, com quem a família Bolsonaro sempre fez questão de estar alinhada. “O Brasil é um dos países mais estratégicos para articular essa política antigênero dentro da ONU”, repara Luciana.

Articulação conservadora

Sem especificar quem estaria por trás do que chama de financiamento internacional para tentar pautar nas Nações Unidas ações de retrocesso às conquistas feministas ou “impedir avanços contrários as discriminações de gênero”, Luciana antecipa que “são grupos internacionais que financiam esse tipo de política. Boa parte desses grupos são dos Estados Unidos”.

No caso específico do Brasil, esses articuladores são conhecidos. “No governo Bolsonaro, torna-se evidente que são recursos públicos que financiam essa estratégia”, aponta. Segundo Luciana, Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de Bolsonaro, tem atuado fortemente em fóruns multilaterais, apresentando ideias alinhadas ao pensamento que busca retrocesso nas políticas de gênero até agora firmadas internacionalmente.

“O que os pesquisadores estão fazendo é mapear isso. É uma investigação muito difícil, mas a avaliação indica, de fato, uma estratégia internacional”, cogita. A Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure) é apontada como um desses articuladores antigênero. “Já foi comprovado que essa instituição está atuando em todas as pautas que se referem às questões de gênero nos tribunais. Sempre para dar um viés conservador e retirar direitos das mulheres”, ilustra.

Questionada sobre o interesse concreto dessas articulações, a professora explica que a ação vem do mesmo tipo de organizações conservadoras que financiam as políticas gerais da extrema-direita, diz Luciana. “São disputas que representam interesses de avanço no campo das ideias políticas”, sinaliza. O que está em jogo no caso do Brasil, são ocupações de cargos, pois toda mobilização da pauta antigênero tem motivação populista e elege seus representantes. “Nós vimos isso na última eleição de forma muito forte”, conclui.

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