EDUCAÇÃO

Colégio proíbe manifestação que não seja verde e amarelo

Colégio Farroupilha enviou comunicado restringindo manifestação política, mas permite bandeiras do Brasil. Juristas veem razoabilidade e cinismo ao mesmo tempo
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 7 de outubro de 2022
Colégio proíbe manifestação que não seja verde e amarelo

Foto: Colégio Farroupuilha/Divulgação

Comunicado do Colégio Farroupilha para pais e professores da comunidade escolar proíbe e limita a manifestação política, mas permite a identificação com cores de um dos candidatos

Foto: Colégio Farroupuilha/Divulgação

A Associação de Mães e Pais pela Democracia (AMPD) está denunciando o tradicional Colégio Farroupilha, de Porto Alegre, por atuação parcial durante o período que a sociedade está realizando discussões sobre o segundo turno das eleições nacionais.

Comunicado da escola para pais e professores da comunidade escolar proíbe e limita a manifestação política. Segundo nota da AMPD, por um lado o estabelecimento afirma que “não são permitidas bandeiras, vestimentas ou acessórios com símbolos de partidos políticos”. De outro, é permitido que alunos levem a bandeira do Brasil.

“Ao liberar a bandeira do Brasil que é um símbolo de identificação bolsonarista nestas eleições, uma infeliz apropriação do símbolo nacional por um partido, a escola fere a pluralidade e a liberdade de aprender e ensinar, previstas na Constituição Federal”, afirma a associação.

Aline Kerber, presidente da AMPD, informou que a associação apresentou denúncia no Ministério Público do Trabalho (MPT) nessa quinta-feira, 6.

Hoje, 7, serão feitas denúncias no Ministério Público Eleitoral (MPE) e no Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS).

Aline vê a situação como algo “muito grave, imparcial, uma bizarrice que disseram foi escrita até por advogados da equipe diretiva do Conselho da Escola”.

Relatos de dentro do Colégio

Segundo ela, conforme relatos que recebe, no primeiro turno não houve esse tipo de atitude. “Não foi tão explícito; foram mais discretos”, diz. No entanto, acrescenta, que houve casos ditos de professores chamados e questionados do porquê estar usando roupas vermelhas.

Aline disse que, pelos casos que lhe estão sendo encaminhados, ações semelhantes ao Farroupilha começam a acontecer em outros estabelecimentos de ensino, inclusive públicos.

“No primeiro turno, candidatos podiam ir às escolas”, lembra ao citar o exemplo da rede pública do município de Porto Alegre. “Agora, parece que acabou a democracia”, ironiza.

“Há eleitores nas escolas e eles estão tendo o seu direito violado. São alunos sofrendo bullying, tendo seus adesivos retirados”, descreve.

Juristas

“A carta da escola me pareceu razoável até o último parágrafo. Liberar os estudantes para levar a bandeira do Brasil à escola é puro cinismo, pois nesse momento se transformou no símbolo de um dos candidatos. Lamentável. Se eu fosse mãe de um estudante enviaria uma carta reclamando”, afirma Gisele Cittadino, professora e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e fundadora da Associação de Juristas pela Democracia (ABJD).

Ela deixa claro que é contra a manifestação político-partidária de professores em sala de aula. Por outro lado, “sou super a favor dos estudantes fazerem da escola espaço público democrático. Ninguém aprende a ser cidadão senão reivindicando seus direitos, inclusive o de ter candidato. Mas aí todas as bandeiras partidárias e do Brasil deveriam valer”.

Não há neutralidade no verde e amarelo

Também professor da PUC-Rio e coordenador de Direito Constitucional com ênfase em Estado e Sociedade naquela universidade, Fábio Carvalho Leite entende que não convence o argumento de que camisa da seleção brasileira, bandeira do Brasil, seria uma coisa neutra; “dentro deste contexto não é”.

Segundo ele, autor de livros sobre liberdade religiosa e de expressão, citado várias vezes em debates do Supremo Tribunal Federal (STF), o direito brasileiro não tem regras sobre a liberdade de expressão. “Eu sou um daqueles poucos que defende que deveria ter alguma, nem que seja uma posição jurisprudencial”, defende.

Para Carvalho Leite, no entanto, a escola não poderia fazer o que fez. “Me baseando um pouco no direito americano – porque lá tem regras e olha que o direito americano, todo mundo sabe, é bem pró-liberdade do direito de expressão.

O jurista cita que, considerando o ambiente escolar, uma manifestação pode ser disruptiva.

“Esse é o termo da Suprema Corte dos Estados Unidos. A escola pode restringir nesse período (eleitoral) por causa desse contexto. É uma questão de tempo e lugar; uma regulação considerando tempo e lugar. Este período eleitoral é o que permite, por exemplo, muitas restrições. O problema desse caso é permitir um e proibir outro. Isso é que é bem complicado” reflete.

O que diz a escola

O Extra Classe entrou em contato com a assessoria de comunicação do Colégio Farroupilha e foi dito que a instituição não iria se manifestar. “A posição da escola já está na nota enviada aos pais”, registraram.

Colégio Farroupilha

O Colégio Farroupilha foi fundado em 1886 pela pela Deutscher Hilfsverein (Associação Beneficente Alemã), criada para auxiliar os imigrantes alemães e seus descendentes. Em 2001 a instituição firmou parceria com a 3ª Região Militar do Exército Brasileiro e criou a Escola de Instrução Militar (EsIM).

A ideia foi proporcionar a prestação do Serviço Militar aos estudantes da 3ª série do ensino médio que estão próximos à idade de alistamento para, segundo o colégio, difundir “valores como civismo, cidadania e patriotismo no meio estudantil”.

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