JUSTIÇA

Marco temporal: STF adia decisão sobre demarcação de áreas indígenas

Após dois adiamentos na semana e sob forte mobilização de povos indígenas e pressão de ruralistas, ministro devem retomar julgamento na quarta-feira
Por Gilson Camargo / Publicado em 27 de agosto de 2021

Foto: Tiago Miotto/Cimi

Indígenas acompanharam leitura do relatório pelo ministro Fachin, após adiamento da sessão

Foto: Tiago Miotto/Cimi

O julgamento sobre a questão do “marco temporal” das demarcações de Terras Indígenas (TIs) no Supremo Tribunal Federal (STF) foi suspenso, após a leitura do relatório inicial do ministro Edson Fachin, no final da tarde de quinta-feira. Mais de seis mil indígenas que acompanhavam o julgamento, em frente ao STF tiveram de voltar ao Acampamento Luta pela Vida, instalado ao lado da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, sem saber qual a decisão final do caso.

A mobilização dos povos indígenas começou na segunda-feira, 23, com previsão de permanecer no DF até sábado, 28, reunindo 176  povos diferentes de todas as regiões do país. Mobilizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o acampamento é a maior mobilização indígena em 30 anos e, além de acompanhar o processo no STF, protesta contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso.

O julgamento que seria na quarta-feira foi adiado para a quinta-feira para esperar a análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.696, sobre a lei que prevê a autonomia do Banco Central, mas acabou suspenso no final da tarde. Após um intervalo de descanso, só foi possível a Fachin ler seu relatório, documento que resume o histórico do processo.

O STF vem sendo pressionado por ruralistas que estão em Brasília para pressionar pela aprovação do marco temporal, medida que, na prática, acaba com a demarcação de terras indígenas no país e favorece o agronegócio.

Novo julgamento

O Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que discute a definição do estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena ​e desde quando essa ocupação deverá prevalecer, o chamado marco temporal, só voltará à pauta do Supremo na quarta-feira, 1º de setembro, com mais de 40 pronunciamentos das partes e interessados.

Caso não seja novamente adiado, o julgamento do recurso, com repercussão geral (Tema 1.031), servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 82 casos semelhantes que estão sobrestados.

Entre os ministros, a controvérsia é em relação à legitimidade de uma reintegração de posse requerida pela Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (Fatma) de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como sendo de tradicional ocupação indígena.

Ao analisar a questão, o Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4) entendeu que não há elementos que demonstrem que as terras seriam tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, como previsto na Constituição Federal (artigo 231), e confirmou a sentença que determinou a reintegração de posse ao órgão ambiental.

No recurso ao STF, a Funai sustenta que o caso trata de direito imprescritível da comunidade indígena, cujas terras são inalienáveis e indisponíveis. Segundo a autarquia, a decisão do TRF-4 afastou a interpretação constitucional (artigo 231) sobre o reconhecimento da posse e do usufruto de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e privilegiou o direito de posse de quem consta como proprietário no registro de imóveis, em detrimento do direito originário dos indígenas.

Desde maio de 2020, o ministro Fachin determinou a suspensão da tramitação de processos sobre áreas indígenas até o fim da pandemia da Covid-19, por entender que medidas como reintegração de posse podem agravar o risco de contágio do vírus. Ao deferir a suspensão, o ministro afirmou que, em decorrência das reintegrações, os indígenas correm o risco de ficar, “repentinamente, aglomerados em beiras de rodovias, desassistidos e sem condições mínimas de higiene e isolamento”.

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