SAÚDE

CoronaVac: parlamentares convocam Anvisa e Butantan para debate

Audiência pública virtual deve confrontar versões sobre morte de voluntário que levou a agência reguladora a interferir no desenvolvimento da CoronaVac pelo instituto
Da Redação* / Publicado em 11 de novembro de 2020
Interrupção de testes com vacina antiCovid produzida em São Paulo pela chinesa Sinovac foi usada politicamente pelo Planalto

Foto: Butantan/ Divulgação

Interrupção de testes com vacina antiCovid produzida em São Paulo pela chinesa Sinovac foi usada politicamente pelo Planalto

Foto: Butantan/ Divulgação

A interrupção das pesquisas sobre a vacina contra o coronavírus comemorada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na última terça-feira, será tema de uma audiência pública da comissão mista que acompanha as medidas do Poder Executivo no enfrentamento à pandemia de Covid-19.

O presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, e o diretor do Instituto Butantan, Dimas Tadeu Covas, participam da audiência pública virtual na próxima sexta-feira. Os requerimentos para a realização do debate foram aprovados nesta quarta, 11, por senadores e deputados, em reunião da comissão, que é presidida pelo senador Confúcio Moura (MDB-RO).

Em um episódio cercado de contradições e poucos esclarecimentos, a Anvisa, que é presidida por um aliado de Bolsonaro, suspendeu os testes da vacina CoronaVac em humanos na última segunda-feira. Sem apresentar detalhes do caso, a agência informou por meio de nota que a interrupção ocorreu devido a um “evento adverso grave”. Torres sustenta que a decisão de suspender os testes foi técnica. A vacina é desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo.

Torres, da Anvisa, sustenta que a decisão foi técnica

Foto: Agência Senado

Torres, da Anvisa, sustenta que a decisão foi técnica

Foto: Agência Senado

O Instituto Butantan criticou a medida. Em entrevista coletiva, o presidente do órgão de pesquisa informou que o “evento adverso grave” não teve relação com a vacina – um dos voluntários que participou dos testes teria cometido suicídio. Como a informação foi mantida em sigilo por questões éticas, Jair Bolsonaro aproveitou a oportunidade para fazer mais um ataque ao desenvolvimento da vacina em sua cruzada de negação da pandemia.

A politização em cima da grave crise de saúde pública pelo presidente foi condenada pelos parlamentares.

Dimas Covas, do Butantan: "impossível que efeito adverso tenha relação com a vacina"

Foto: Governo de São Paulo/ Divulgação

Dimas Covas, do Butantan: “impossível que efeito adverso tenha relação com a vacina”

Foto: Governo de São Paulo/ Divulgação

O senador Izalci (PSDB-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista de Ciência, Tecnologia, Inovação e Pesquisa, classificou como “lamentável” a paralisação das pesquisas com a CoronaVac. O parlamentar lembrou que “ciência não tem partido”.

“O Instituto Butantan não pode sofrer o que está sofrendo. Ele tem 126 anos, produz e distribui 80% da vacina H1N1. O Butantan não é do Doria. É do povo brasileiro. Não dá para fazer o que fizeram. Lamento muito a posição da Anvisa. Foram negligentes e politizaram” criticou.

O senador Espiridião Amim (PP-SC) disse que a comissão mista tem “responsabilidade e autoridade” para convocar os representantes da Anvisa e do Instituto Butantan. O parlamentar criticou a politização que envolve a vacinação contra o coronavírus. O tema é alvo de embates públicos entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Doria. “Ninguém aqui é ingênuo para achar que só um lado está politizando. Está havendo politização em exagero, sim. Mas não venham dizer que é mocinho contra bandido. Que é o bem contra o mal. Como toda politização radical, é de ambas as partes”, afirmou.

Revolta e indignação

Para a senadora Eliziane Gama (Cidadania), Anvisa assumiu postura ideológica e política. "Comemoração do presidente é algo que nos traz revolta e indignação"

Foto: Edilson Rodrigues/ Arquivo/ Agência Senado

Para a senadora Eliziane Gama (Cidadania), Anvisa assumiu postura ideológica e política. “Comemoração do presidente é algo que nos traz revolta e indignação”

Foto: Edilson Rodrigues/ Arquivo/ Agência Senado

A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) disse ter recebido a notícia da suspensão das pesquisas com “muita indignação”. Ela criticou ainda uma publicação nas redes sociais em que o presidente da República comemora a decisão da Anvisa de interromper os testes. Nas redes sociais, Bolsonaro comemorou, referindo-se a ele próprio na terceira pessoa: “Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”.

“Mais de 1,2 milhão de pessoas vieram a óbito em todo o mundo. No Brasil, mais de 162 mil pessoas. Milhões de famílias em todo o mundo aguardando o início da vacinação em massa. Aqui no Brasil, os estudos caminhando. Mas, de repente, temos uma suspensão. Não era esperado. A gente vê notadamente uma postura ideológica e política na Anvisa, e não uma postura técnica. E a comemoração do presidente da República é algo que nos traz revolta e indignação”, indignou-se Eliziane.

A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) também criticou a interrupção das pesquisas. Ela lembrou que o Instituto Butantan, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Evandro Chagas são referências internacionais na área de pesquisa biomédica.

“Quando li a notícia, doeu. Eu conheço a história do Butantan, da Fiocruz e do Evandro Chagas. Nós temos os melhores virologistas do mundo. O que doeu ali foi porque era como se se questionasse a credibilidade do Instituto Butantan. Isso não é para ser politizado. Nós nunca vamos ter a sensibilidade do presidente da República em relação à covid. Na verdade, ele é indiferente”, lamentou.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) citou uma reportagem do jornal britânico The Telegraph. Segundo a matéria, o Reino Unido pode começar a vacinação em massa dos cidadãos no dia 1º de dezembro com três imunizantes diferentes. “Estamos mal e muito atrasados. A gente fica no meio de uma briga política. A mortalidade pode começar a diminuir na Grã-Bretanha a partir da vacinação, e aqui a gente mistura vacinação com briga política. É lamentável”.

*Com informações da Agência Senado.

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