EDUCAÇÃO

PEC do Fundeb aponta avanços e mobiliza educadores

Sob ataques de liberais, trabalhadores da educação defendem aprovação do Relatório apesar de algumas divergências. As hastags #FundebPraValer e #VotaFundeb tomam conta das redes sociais
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 16 de julho de 2020
Fundeb tem como objetivos manter e desenvolver a educação básica pública e valorizar os trabalhadores da educação, diz Nalú Farenzena, presidente da Fineduca.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Fundeb tem como objetivos manter e desenvolver a educação básica pública e valorizar os trabalhadores da educação, diz Nalú Farenzena, presidente da Fineduca.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Proposta de Emenda Constitucional que envolve o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), a PEC 15/2015, será votada pela Câmara dos Deputados nos dias 20 e 21 de julho, segundo acordo dos líderes da Casa. A relatora, deputada Professora Dorinha Rezende (DEM-TO), afirma que não pretende fazer novos ajustes e educadores comemoram supressões e melhorias conquistadas.

“O relatório foi apresentado, agora precisa ser mantido e votado. Se for para ser alterado tem que ser para melhor”, expõe Daniel Cara, integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), destaca que apesar de existir ainda alguns pontos discordantes no parecer, a defesa da aprovação é importante.

A CNTE, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e parceiros estão realizando tuitaços com a hashtag #VotaFundeb. Diversos artistas e intelectuais aderiram a mobilização. Também diversos parlamentares, entidades e organizações da sociedade civil estão publicando a tag nas redes sociais. A Internacional da Educação ressalta a absoluta emergência a aprovação do Fundo.

Para o professor Daniel Cara, todos os interessados em uma educação pública de qualidade têm que buscar formas de pressionar a Câmara. Ele afirma que é importante que o presidente da casa (Rodrigo Maia) entenda que é preciso ouvir os educadores e não “as fundações e associações empresariais que atrapalham a educação”.

Fundeb permanente e com recursos da União

A PEC agora assegura um Fundeb permanente, com recursos adicionais da União, vindos de rubricas como os royalties da exploração do petróleo, que já têm a educação como destino original. Ainda de acordo com a proposta, a complementação da União terá que chegar a 23 Estados (atualmente nove recebem) e municípios pobres, independentemente de integrarem estados ricos também receberão esses repasses.

Outro avanço apontado por educadores é a inserção do chamado sistema híbrido de distribuição de recursos. Esse mecanismo combina o atual modelo VAA (Valor Aluno Ano) com um novo, o VAAT (Valor Aluno Ano Total).

Para os mais variados integrantes do movimento Campanha Nacional pelo Direito à Educação a modificação promove equidade e não inviabiliza a oferta educacional de grandes municípios e redes estaduais do Norte e Nordeste do país.

Daniel Cara ainda registra que o relatório “acertou a redação do Custo Aluno-Qualidade (CAQ), que agora se propõe que seja constitucionalizado”.

O CAQ, conforme carta à sociedade, emitida pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, é “referência de justiça federativa, aliando qualidade e financiamento”.

Na questão da qualidade, Lúcia Camini, ex-secretária de Educação do Rio Grande do Sul e integrante do Conselho Estadual de Educação do Estado (CEEd), registra um ponto de atenção. Ela é contrária aos mecanismos de “meritocracia” colocado no relatório por integrantes do Centrão.

Lúcia entende que vai se “estabelecer uma competição entre desiguais”. Lembra que, mesmo com o Fundeb, continuarão a existir municípios que têm melhores condições e outros que serão extremamente dependentes do fundo.

Na mira de Guedes, Maia e partido Novo

Segundo Heleno Araújo, os ataques liberais ao Fundeb estão se intensificando sob o patrocínio do ministro da Economia Paulo Guedes, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e do partido Novo. Ele cita artigos que estão proliferando para defender o não destino de 70% do Fundo para o pagamento de salários dos profissionais em educação e até a “voucherização” do ensino.

O dirigente sindical entende que a ideia dos vouchers para que estudantes tenham acesso a escolas privadas – especialmente defendida pelo partido Novo – atende pessoas como a irmã de Paulo Guedes. Elizabeth Guedes é presidente da Associação Nacional de Universidades Privadas (Anup). “É gente que quer enriquecer com dinheiro público”, declara Araújo.

Tentativa de manobra contábil

Foram pareceres técnicos e estudos da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca) e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação que convenceram a relatora retirar uma proposta do presidente da Câmara: a incorporação da contribuição social do Salário-Educação à participação do Governo Federal para aumentar o Fundo.

Conforme demonstraram os especialistas, a ideia de Rodrigo Maia, deixaria a alimentação escolar – uma das principais despesas pagas com o Salário-Educação – sem recursos.

Na realidade, a ideia era uma manobra contábil que iria retirar recursos da merenda de milhões de estudantes. Segundo Nalú Farenzena, presidente da Fineduca, apesar da natureza contábil do Fundeb, ele tem “como objetivos manter e desenvolver a educação básica pública e valorizar os trabalhadores da educação”.

Brasil usa pouco recurso por aluno

A deputada Dorinha sustenta a importância do aumento de repasses à educação porque o Brasil ainda gasta pouco per capita com seus alunos. “O gasto por estudante na educação básica fica bem abaixo da média da OCDE (Cooperação e Desenvolvimento Econômico) “, disse a parlamentar.

Além disso, diz a relatora, “agora vamos precisar gastar mais no pós-pandemia: dividir salas de aula, contratar mais professores, receber os alunos vindos das escolas privadas (que não conseguiram mais pagar mensalidades). E muito disso está nas mãos dos municípios, o elo mais frágil (do Poder Executivo)”.

Empurrando com a barriga

Com a crise do novo coronavírus, integrantes da Frente Parlamentar em Defesa do Plano Nacional de Educação chegaram a temer que o governo jogasse no momento apenas para prorrogar o Fundeb que se extingue em 31 de dezembro caso não houver sua renovação.

No lugar do então ministro da Educação, Abraham Weintraub, que era contra a ampliação de recursos para o fundo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi o agente político mais forte do Executivo no assunto.

Guedes já disse uma vez sempre teve a convicção de que os brasileiros adoram um fundo. “Temos fundos para tudo – defesa dos Direitos Difusos, Participação de Estados e de Municípios, Criança e Adolescente, Idoso, Exportações, e por aí vai. Nem mesmo o Governo Federal sabe ao certo quantos são”.

Tanto no relatório quanto entre os deputados, a hipótese de somente prorrogar o fundo é matéria vencida. A cota do governo federal na composição do Fundeb passará dos atuais 10% para 20% em forma escalonada até 2026.

Fundeb e reforma tributária

Diante do impacto nas receitas devido a pandemia, o valor de partida que saltaria para 15% será de 12.5% em 2021. Na sequência, em 2022, 15%; 16,5%, em 2023; 18,0%, em 2024; 19,0%, em 2025 e 20,0%, em 2026.

A participação da União em 2019 foi de R$ 14,3 bilhões de reais (0,2% do PIB brasileiro) na complementação de recursos para nove estados. O valor total do Fundeb corresponde a 2,3% do PIB, R$ 157,3 bilhões de reais e é suportado em 91% pelos estados, distrito federal e municípios.

Como o Fundeb é composto por um conjunto de impostos um artigo na nova proposição foi incluído. O Objetivo é preservar o valor nominal do fundo caso houver alguma reforma tributária.

A PL 15/2015 tem que ser votada e sancionada até o fim do ano. Caso não ocorra, poderá haver um colapso na educação fundamental pública que ficará sem recursos em 2021. Até 31 de dezembro a matéria precisa ser votada em dois turnos na Câmara e em dois turnos no Senado. É necessário para sua aprovação três quintos dos votos dos deputados (308) e dos senadores (49).

Comentários