JUSTIÇA

Liminar impede trabalho infantil em Serafina Corrêa

Metalúrgica utilizava mão de obra de adolescentes em local perigoso e insalubre, atividade listada entre as piores formas de sujeição de crianças ao trabalho
Por Gilson Camargo* / Publicado em 17 de maio de 2020
Com um índice de contaminação por Covid-19 cinco vezes maior que a capital gaúcha, Serafina Corrêa, interditou os espaços públicos (foto) no dai 11 de maio devido à pandemia. Além do trabalho infantil, a indústria não protegia seus trabalhadores

Foto: PMSC/ Divulgação

Com um índice de contaminação por Covid-19 cinco vezes maior que a capital gaúcha, Serafina Corrêa, interditou os espaços públicos (foto) no dai 11 de maio devido à pandemia. Além do trabalho infantil, a indústria não protegia seus trabalhadores

Foto: PMSC/ Divulgação

Com base em uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPTRS) obteve tutela de urgência em uma ação civil pública ajuizada contra a metalúrgica Total Indústria e Comércio de Conexões, de Serafina Corrêa, município da região Norte do estado com 17,5 mil habitantes, para impedir trabalho infantil em ambiente insalubre e sujeito a acidentes no local. A indústria é uma das empresas contempladas pela prefeitura, em novembro do ano passado, com um lote urbano na Área Industrial Busada – Linha Porto Alegre, o novo distrito industrial do município.

O atividade exercida pelos adolescentes na metalúrgica está listada como uma das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), adotada pelo governo brasileiro por meio do Decreto 6.481/2008, que regulamentou a Convenção 182 da OIT. De acordo com o tratado, entre as formas mais degradantes de submissão de crianças e adolescentes ao trabalho estão atividades que, “por sua natureza ou pelas circunstâncias em que são executadas, são suscetíveis de prejudicar a saúde, a segurança e a moral da criança”.

A ação do MPT foi fundamentada em relatórios da Vigilância Sanitária e do Conselho Tutelar do município, que flagraram a presença de quatro adolescentes entre os empregados da Total Indústria e Comércio de Conexões Ltda. De acordo com os órgãos municipais, os menores operavam até tornos mecânicos e prensas e, além da exposição a acidentes e atividades insalubres, não usavam equipamentos de proteção individual contra o contágio pelo novo coronavírus.

De acordo com a decisão da Justiça do Trabalho, a empresa foi condenada a se abster de admitir trabalhadores com idade inferior a 18 anos para prestar trabalho em condições perigosas, insalubres, em horário noturno ou em atividades proibidas ou relacionadas na Lista TIP e a impedir acesso e trabalho de menores de 18 anos ao setor produtivo, caracterizado como perigoso ou insalubre. Em caso de descumprimento das obrigações, a multa é de R$ 3 mil por trabalhador em situação irregular, a ser revertida para entidade destinada ao combate da pandemia de Covid-19.

Presença de adolescentes na indústria foi flagarada pela Vigilância Sanitária do município

Foto: Vigilância Sanitária

Presença de adolescentes na indústria foi flagarada pela Vigilância Sanitária do município

Foto: Vigilância Sanitária

A presença de adolescentes na área de produção da indústria e a exposição deles a riscos de acidentes foi flagrada pela Vigilância Sanitária do município, que também demonstrou a aglomeração de pessoas trabalhando, sem a adoção de medidas de higiene para evitar o risco de contaminação pela Covid-19. Serafina Corrêa está entre os municípios mais atingidos pela pandemia, com 139,1 contágios por cem mil habitantes. O índice de contaminação local é quase cinco vezes superior ao de Porto Alegre.

APRENDIZAGEM – A ação civil pública ajuizada pela procuradora Martha Diverio Kruse, do MPT em Passo Fundo que tem abrangência sobre o município, também pediu urgência na regularização da situação dos trabalhadores adolescentes, que devem ser inseridos em “programa de aprendizagem e formação técnico-profissional metódica, compatível com seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, na forma prevista pelo artigo 428 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ou seja, em trabalho protegido”. Esse pedido será analisado quando do julgamento definitivo da ação. O MPT requereu ainda o pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 30 mil, a ser revertido para entidades da região, e indenização por danos morais individuais para cada um dos adolescentes expostos ao trabalho perigoso, no valor de R$ 10 mil.

A decisão foi proferida pela juíza Marcela Casanova Viana Arena, do Posto da Justiça do Trabalho em Marau, vinculado ao Foro em Passo Fundo, com jurisdição sobre Serafina Corrêa. A magistrada acolheu os fundamentos jurídicos apresentados pelo MPT, explicando que a Constituição Federal estabelece, em seu art. 7º, inciso XXXIII, a “proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos”.

De acordo com a decisão, a peculiaridade do trabalho do menor merece especial proteção, por se tratar de pessoa em desenvolvimento. A Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelecem que é dever não apenas da família, mas de toda a “sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à saúde, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

*Com informações do MPTRS.

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