POLÍTICA

Bolsonaro suspende contratos de trabalho por quatro meses

Medida Provisória publicada na noite de domingo, 22, mantém vínculo de emprego, substitui trabalho presencial por remoto ou curso de qualificação e permite que empregador pague qualquer valor ao empregado
Por Gilson Camargo / Publicado em 23 de março de 2020
Depois de dizer a empresários na sexta-feira, que “a economia não pode parar”, Bolsonaro fez teleconferência no domingo com prefeitos (foto) e sinalizou em outra direção: “da nossa parte, como diz o ministro Paulo Guedes, da Economia, não faltarão recursos para a saúde do nosso povo bem como para a manutenção de empregos”. Horas, publicou a MP que institui o trabalho sem salário

Foto: Isac Nóbrega/ Presidência da República

Depois de dizer a empresários na sexta-feira, que “a economia não pode parar”, Bolsonaro fez teleconferência no domingo com prefeitos (foto) e sinalizou em outra direção: “da nossa parte, como diz o ministro Paulo Guedes, da Economia, não faltarão recursos para a saúde do nosso povo bem como para a manutenção de empregos”. Horas, publicou a MP que institui o trabalho sem salário

Foto: Isac Nóbrega/ Presidência da República

 

Enquanto governos e setor produtivo estão mobilizados em quase todo o planeta para reduzir o impacto da pandemia de coronavírus na vida das famílias por meio de políticas de renda mínima, o presidente brasileiro, sem ações concretas para enfrentar a crise na área da Saúde, deu mais um passo para beneficiar empresários, retirando o que resta de direitos da classe trabalhadora do setor privado. Uma medida provisória publicada no final da noite de domingo, 22, e que atende o lobby de empresas hotelerias, suspende contratos de trabalho pelo período de quatro meses.

Na contramão do que estão fazendo a Inglaterra, que deve bancar 80% dos salários dos trabalhadores que ficarão em casa, e dos Estados Unidos, onde está em votação no Congresso a adoção de renda mínima de US$ 1 mil por trabalhador, a MP 927, de Jair Bolsonaro (sem partido) permite aos empresários, mediante negociação sem a participação dos sindicatos e independente de convenção coletiva, pagar qualquer valor aos seus funcionários pelo período de quatro meses, o mesmo da vigência do estado de calamidade pública aprovado pelo Senado na sexta-feira, 20. Na prática, a medida de Bolsonaro institui o trabalho sem salário.

Na noite de domingo, a Justiça Federal atendeu pedido da Defensoria Pública da União e deu prazo de 72h para que Bolsonaro detalhe os planos de combate ao novo coronavírus no Rio

Foto: Carolina Antunes/Presidência da República

Na noite de domingo, a Justiça Federal atendeu pedido da Defensoria Pública da União e deu prazo de 72h para que Bolsonaro detalhe os planos de combate ao novo coronavírus no Rio

Foto: Carolina Antunes/Presidência da República

A MP tem força de lei pelo período de 60 dias e pode ser prorrogada por mais 60 até que seja apreciada pelo Congresso. Caso não seja votada perde a validade. Publicada no Diário Oficial de domingo, 22, a medida determina que o empregado deixe de trabalhar pelo período de quatro meses, dispensa o empregador do pagamento do salário e obriga a empresa oferecer curso de qualificação on-line ao trabalhador, além de manter benefícios, como plano de saúde.

A medida libera a “negociação” entre empregadores e empregados e sobrepõe esses acordos diretos individuais ou com grupos de empregados aos acordos coletivos e à lei trabalhista. O curso ou plano de qualificação profissional on-line será promovido pelo empregador, diretamente ou por meio de entidades responsáveis pela qualificação.

De acordo com o texto, a suspensão do contrato de trabalho também poderá ser feita por “negociação” direta com o empregador. Nos contratos de trabalho mantidos não haverá pagamento sem salário e o empregador “poderá” conceder uma ajuda compensatória mensal, “sem natureza salarial”, “com valor definido livremente entre empregado e empregador, via negociação individual”. Os acordos deverão ser registrados em carteira.

INCONSTITUCIONAL – Apesar de sobrepor os acordos diretos à legislação trabalhista e a diversos dispositivos constitucionais, a MP remete ao artigo 503 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ao determinar que “o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição”. O texto da CLT estabelece que a jornada e o salário poderão ser reduzidos em até 25% em razão de “força maior”. O advogado Marcelo Ott, da assessoria jurídica do Sindicato dos Professores (Sinpro/RS), alerta, no entanto, que o artigo 2º da MP é inconstitucional. “A redução de salário sem previsão contida em acordo coletivo de trabalho, firmado junto ao sindicato, é ato inconstitucional, sendo vedada de forma expressa pela Constituição Federal”, ressalta.

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